Na década de 1970, o cinema viveu tempos atribulados e, ao mesmo tempo, recheados de interessantíssimos contrastes. Foi o tempo de nascimento dos modernos “blockbusters” — lembremos o impacto decisivo de “Tubarão”, em 1975. E também, em paralelo, uma época de modas passageiras, mas recheadas de bons espectáculos — por exemplo, os policiais baseados em obras de Agatha Christie, na sequência do sucesso, em 1974, de “Um Crime no Expresso do Oriente”.
No original “Murder by Death”, “Um Cadáver de Sobremesa” (1976) não se inspira em Agatha Christie, mas integra esse gosto pelas intrigas construídas em torno da investigação labiríntica de um crime. Com um “desvio” que importa sublinhar: estamos perante uma comédia (ou “alta comédia”, como se diz no teatro) em que a crescente complicação das peripécias surge pontuada por um humor subtil e envolvente.
Descobrimos, assim, o mistério de um assassinato numa mansão que parece assombrada… São convocados alguns dos maiores especialistas em crimes enigmáticos, num processo em que as situações mais dramáticas vão sendo contaminadas pela ironia e pelo riso. Ou não estivéssemos perante um argumento assinado por um mestre como Neil Simon (1927-2018), personagem lendária do teatro da Broadway e do cinema de Hollywood — neste caso, ele caracteriza os detectives do filme como “duplos” de figuras célebres da tradição do policial, em particular na área do romance.
Robert Moore (1927-1984), também ele encenador teatral, dirige “Um Cadáver de Sobremesa” com contenção e elegância, sabendo rentabilizar o elenco de luxo que tem à sua disposição. Entre os nomes desse elenco estão Alec Guinness, David Niven, Maggie Smith, Peter Falk e ainda o genial Peter Sellers, compondo a personagem do requintado investigador de origem chinesa, de seu nome Sidney Wang.