Uma das ilusões do presente cinematográfico consiste em julgar que a espetacular evolução tecnológica dos filmes (da produção à difusão) faz com que o passado seja uma acumulação de histórias convencionais e temas “antigos”… A essa visão preguiçosa e, afinal, mentirosa importa contrapor a riqueza e os contrastes da memória cinéfila.
Uma efeméride pode ajudar-nos a ilustrar os valores dessa memória: “WarGames” (1983), entre nós lançado como “Jogos de Guerra”, filme de John Badham protagonizado pelos jovens Matthew Broderick e Ally Sheedy. Trata-se de um genuíno clássico, pioneiro na abordagem das relações da juventude com o mundo dos computadores — por estes dias (3 de junho), passam 40 anos sobre a sua data de estreia.
O motor da história envolve uma inesperada teia de emoções, à época verdadeiramente vanguardista. O protagonista é David Lightman (foi um dos primeiríssimos papéis de Broderick, tinha 20 anos), jovem estudante que se delicia com os jogos do seu novo computador. Até que decide experimentar aquele que dá pelo nome de “Guerra Termonuclear Global”… Subitamente, percebe que, por algum erro informático que o ultrapassa, os combates de mísseis com que está a divertir-se estão a envolver o próprio NORAD, isto é, o sistema de defesa aérea dos EUA…
Não estamos perante uma tese política, entenda-se. Nem sequer se trata de um relato jornalístico de uma experiência real. “WarGames” é um “thriller” que constrói a sua delirante ficção através de elementos palpáveis do universo militar e das estruturas de defesa nuclear. Badham consegue, assim, um espetáculo de invulgar tensão a partir de temas e inquietações do próprio presente em que o filme nasceu.
Atualmente com 83 anos (nasceu em Inglaterra, mas vive nos EUA desde a adolescência), Badham retirou-se do cinema no final da década de 1990 (transferindo-se para o meio televisivo), com uma filmografia típica de um talentoso artesão capaz de se exprimir nos mais diversos registos. Vale a pena lembrar que o filme que lhe deu visibilidade (e especiais vantagens no interior da indústria) foi “Febre de Sábado à Noite”, transformando John Travolta numa estrela global. Da sua filmografia constam também, por exemplo, um “Drácula” (1979), com Frank Langella, e “Curto-Circuito”, comédia de ficção científica sobre a criação de um robot.