Filas e deceção nos quiosques de Paris em busca do "Charlie Hebdo"
Milhares de exemplares do "Charlie Hebdo" foram vendidos num ápice nos quiosques de Paris logo pela manhã, uma semana depois do atentado que causou 12 vítimas mortais, incluindo os "cartoonistas" históricos do jornal - Charb, Cabu, Wolinski e Tignous.
No quiosque de Buzenval, no leste de Paris, a fila ultrapassava as trinta pessoas antes mesmo de o quiosque abrir.
Fábio Godinho foi a sete quiosques esta manhã, numa aventura de moto que começou às 6:15 e que terminou sem sucesso cerca de uma hora depois.
"Comecei às 6:15 em Montreuil, eles tinham aberto às 6:00 e às 6:15 já não tinham nada. Continuei a procurar em Montreuil, depois fui a Vincennes, havia dois quiosques que tinham tido 100 exemplares do "Charlie Hebdo" mas já tinham tudo vendido. Depois, cheguei à Nation e foi o único sítio onde vi que ainda havia exemplares, mas já estavam reservados ontem e já tinham pago. Não consegui", conta o português. "Depois, fui à Alexandre Dumas e agora vim aqui. Procurei em sete quiosques", conta,m desolado, o ator português de 28 anos, a viver em Paris há dez.
Mais sorte teve Michel Durand, residente do vigésimo bairro de Paris e terceira pessoa na fila de espera para a abertura do quiosque de Buzenval.
"Cheguei às 6:15, mesmo sabendo que só abria às 07:00. Costumo vir às 08:00, pensei que houvesse gente, mas não tanta. A primeira pessoa da fila chegou meia hora antes de mim", contou este enfermeiro de 50 anos à Lusa.
De jornal na mão, este leitor assíduo há 30 anos do semanário satírico diz que "a capa é mais um sinal de troça e é corajosa", pensando, inicialmente, que "a caricatura do profeta aparecesse no interior, mas não na capa".
Na capa desta edição do "Charlie Hebdo" está uma caricatura de Maomé, a chorar e a segurar um cartaz que diz "Je suis Charlie" ("Eu sou Charlie") e com o título "Está tudo perdoado".
No entanto, Fabrice Gellier sugere que "o melhor é virar a capa ao contrário e ver outro desenho muito mais provocador". Também não conseguiu chegar a tempo para comprar o jornal.
Este informático de 40 anos lamenta não ter conseguido adquirir um exemplar: "É triste que não haja mais exemplares. Vim muito cedo de propósito, sou um leitor habitual e não consegui uma cópia. Para mim, o maior interesse do cartoon da capa é quando o viramos ao contrário!" O informático estava triste e desiludido, até porque vive a "dois minutos a pé do quiosque".
Com o passar do tempo a fila foi-se formando até que um cliente avisou: "Já não há mais!". Minutos depois, forma-se a mesma linha e o mesmo comportamento dos leitores: "Bom dia! Tem o jornal Charlie Hebdo?".
O empregado do quiosque, Philippe - que prefere não dar o apelido - explicou à Lusa que só recebeu pouco mais de vinte cópias e que nos primeiros vinte minutos do dia pelo menos 50 a 60 pessoas foram pedir o jornal.
"Se houvesse cem exemplares, teríamos vendido. Vai ser assim o dia todo", comentou à Lusa o empregado do quiosque prometendo aos clientes que no dia seguinte vai receber mais exemplares a partir das sete da manhã.
"Como, já não há?!", indignava-se um cliente habitual surpreso pela afluência de pessoas e lembrando que estava anunciada a distribuição de três milhões de cópias. Dezenas de pessoas, de todas as faixas etárias, têm a mesma reação e comentam que já foram a vários quiosques do bairro e que as filas são sempre impressionantes.
Em vez das habituais 60 mil cópias, foram impressos 3 milhões de exemplares, que serão vendidos em 25 países e em 16 línguas.
Lusa
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