José Sócrates foi novamente investigado já depois da acusação na Operação Marquês.
A suspeita nasceu das transferências avultadas recebidas pelo antigo primeiro-ministro, a partir de 2020, na sua conta da Caixa Geral de Depósitos: 12.500 euros mensais, justificados com um contrato de consultoria com Adélio Machado, empresário e ex-piloto de automóveis que já foi à falência em França e em Espanha.
Tal como na Operação Marquês, o alerta chegou ao Ministério Público vindo da Caixa Geral de Depósitos, onde José Sócrates tem conta bancária há anos.
Sendo um ex-primeiro-ministro, Sócrates é considerado um PEP - pessoa politicamente exposta - em relação a quem as instituições financeiras têm por lei especiais deveres de comunicação, no âmbito das medidas de combate ao branqueamento de capitais.
As transferências mensais avultadas a favor do ex-governante tinham origem em duas empresas uma no Luxemburgo e outra em Espanha, ambas ligadas a Adélio Machado.
O homem que contratou Sócrates tinha empresas sediadas no número 61 da Avenida de Suffren, perto da Torre Eiffel, em Paris. A empresa ligada ao imobiliário, a de limpezas e outra de construção estão em insolvência. À SIC, a vizinhança diz que ultimamente só polícia e autoridade tributária batem à porta.
Em setembro de 2015, já Adélio Machado se movia noutro país. Nessa data, aparece como administrador da ETZ Global Telecom, uma sociedade com sede no Luxemburgo sem atividade conhecida, sem site na internet ou contacto telefónico, apenas uma morada para correio num escritório de empresas na capital do grão-ducado.
Foi no entanto a ETZ que, a 23 de janeiro de 2020, assinou um contrato de prestação de serviços com José Sócrates Pinto de Sousa, nessa altura ainda a braços com a fase de instrução da Operação Marquês.
Ao que a SIC apurou naquele documento o antigo governante assume as funções de presidente do Conselho Consultivo Estratégico da ETZ, comprometendo-se a prestar serviços de consultoria técnica e de gestão, em especial, no âmbito do desenvolvimento estratégico para os mercados da América Latina e Países Lusófonos.
O contrato tinha a duração de um ano e o pagamento mensal de 12.500 euros, fora despesas de deslocação, estadias e representação e ainda um prémio a definir em função dos resultados obtidos.
O pagamento, no entanto, não vinha da ETZ, nem do Luxemburgo. Vinha de Espanha, da conta da AMATECH CONSULTING.
Foi através desta sociedade, criada em 2019, que Adélio Machado comprou duas empresas de Bilbao da área da tecnologia. A imprensa local especializada estranhou o interesse do português.
A SIC contactou José Sócrates para falar sobre o contrato que assinou, as funções que desempenhava e o trabalho que efetivamente fez, mas o ex-primeiro-ministro rejeitou, por entender que as questões eram devassa da vida privada.
Não foi possível apurar quantos meses e qual o montante total recebido por Sócrates, mas há um dado que pode ser uma pista.
Beneficiário de uma subvenção vitalícia de 2.400 euros pelos anos em que exerceu cargos políticos, o antigo governante está obrigado a suspender a pensão sempre que tiver outros rendimentos.
De acordo com informação da Caixa Geral de Aposentações, Sócrates suspendeu a subvenção de fevereiro de 2020, um mês depois de assinar o contrato, até outubro de 2021, ou seja durante um ano e oito meses.
Na Operação Marquês, Sócrates foi também investigado por receber 12.500 euros mensais de uma empresa de Paulo Lalanda de Castro. Na acusação, o Ministério Público entendeu que era um esquema para lavar dinheiro.
Em relação ao novo alerta da Caixa Geral de Depósitos, a SIC desconhece se deu origem à abertura de um novo inquérito. A Procuradoria-Geral da República não respondeu à questão.