Pedro Morgado, psiquiatra e autor do estudo "Quem paga a raspadinha", traça o perfil dos jogadores que integram o grupo de maior risco e aponta os problemas associados às perturbações de jogo patológico.
De acordo com o estudo "Quem paga a raspadinha?", apresentado esta terça-feira pelo Conselho Económico e Social (CES) em conjunto com a Universidade do Minho, quem tem rendimentos mais baixos gasta mais dinheiro em raspadinhas do quem tem vencimentos maiores - quem ganha entre 400 e 664 euros por mês, em comparação com pessoas que auferem mais de 1.500 euros.
O investigador começa por notar que muitas das pessoas que gastam dinheiro com este tipo de jogo "fazem-no porque dizem que têm necessidade de ganhar dinheiro" e que, por esse motivo, não percebem que a raspadinha se trata de "um jogo de azar" onde a probabilidade de perder é bastante elevada.
Cerca de 3% dos adultos portugueses em risco de desenvolver problemas com o jogo
Cerca de 3% dos adultos portugueses estão em risco de desenvolver problemas com o jogo e 100.000 pessoas apresentam sintomas por causa do vício das raspadinhas, sendo que, dessas, 30.000 já padecem de patologia de jogo.
O autor do estudo explica que esta é uma doença "em que há uma série de pensamentos e cognições, acerca do jogo, que estão distorcidas".
"A pessoa perde a capacidade de decidir livremente jogar ou não porque acredita que a hipótese de ganhar é maior do que aquela que, efetivamente, acontece porque tem um viés de memória, que faz com que se recorde mais das vezes em que ganhou pouco dinheiro do que da quantidade enorme de dinheiro que gastou ao longo do tempo. Porque acredita que domina as formas de ganhar e, por isso, conhece qual é a raspadinha que vai dar dinheiro (...) e porque tem uma impulsividade associada ao jogo que faz com que quando vê algum sinal associado às raspadinhas, de repente, comece a ter vontade de jogar", descreve Pedro Morgado.
O psiquiatra aponta que estes são os principais sinais, a que acrescem todas as dificuldades do ponto de vista da saúde mental.
Raspadinhas são atualmente um “problema de saúde pública”
Refere que a popularidade que este jogo alcançou em Portugal se deve ao facto de ser barato, acessível e simples e que, por essas razões, as raspadinhas são atualmente um "problema de saúde pública".
"A regulamentação aqui é fundamental. Não defendemos, de forma alguma, a proibição do jogo - a proibição traz mais problemas e eleva a situações de jogo ilegal -, mas aquilo que nós queremos é que a sociedade faça uma reflexão sobre mecanismos que possam proteger melhor estas pessoas e que elas se possam autoexcluir (..), tal como á acontece com outras modalidades de jogo como, por exemplo, o casino", defende.
Pedro Morgado constata que "do ponto de vista do jogo patológico como todas as modalidades de jogo" Portugal apresenta dos níveis mais elevados de prevalência de pessoas em situação de jogo problemático.
Em relação à raspadinha, especificamente, o investigador indica que a mesma "é um fenómeno muito português" e que o número de pessoas que apresentam sintomas patológicos associados a esta forma de jogo "é muito significativo ao nível do contexto internacional", estando a par daquilo que alguns países apresentam para todas as modalidades de jogo.