O Governo grego reagiu à proposta de Portugal para acolher refugiados yazidis, uma minoria étnico-religiosa perseguida no Iraque, classificando-a como "inaceitável" por entender que se trata de "discriminação com base racial".
"O convite específico de Portugal aos yazidis é inaceitável, nenhum Governo pode discriminar com base na raça, e quem está a fazer muito barulho por causa desta questão não está a ajudar os yazidis", disse o ministro da Migração grego, Yannis Mouzalas, citado pela agência noticiosa norte-americana Associated Press (AP).
De acordo com a notícia da AP, Portugal ofereceu-se para acolher alguns dos 2.500 refugiados yazidi que se encontram na Grécia, aguardando reinstalação noutro país europeu, e a Grécia rejeitou a oferta, preocupada com a possibilidade de os outros países começarem também a escolher a dedo os requerentes de asilo com base na religião ou etnia.
O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, garantiu no entanto esta quarta-feira que Portugal não pediu à Grécia para privilegiar a comunidade yazidi e está disponível para receber "todos os refugiados".
"Portugal não dirigiu nenhum pedido à Grécia para privilegiar, fosse a que título fosse, um conjunto étnico dentro do contingente de refugiados que Portugal se disponibilizou a acolher", disse hoje o ministro, na sequência da notícia da AP.
Disse também desconhecer qualquer intenção de Atenas de bloquear a vinda destes refugiados para Portugal.
O governante referiu que já na manhã desta quarta-feira contactou o embaixador português em Atenas e que não há "nenhuma informação da parte das autoridades gregas". "Não confirmo que haja qualquer declaração das autoridades gregas no sentido de impedir, de qualquer forma, a vinda de 38 yazidis de que estamos à espera nos próximos tempos", indicou.
Portugal, garantiu, "acolhe todos os refugiados, independentemente de etnia, de raça, de cor, de qualificação, de género ou de orientação" e já recebeu "mais de 700 refugiados", não praticando nem pedindo para praticar "nenhuma espécie de discriminação, restrição ou diferenciação".
A única preocupação de Portugal em relação aos yazidi é, "na integração cá, ter em conta que essas pessoas pertencem a uma mesma comunidade étnica", procurando fazer com que "não se sintam ainda mais isoladas" no país.
"Quando as autoridades gregas dizem, em geral, que não permitirão nenhuma espécie de discriminação ou quando o ministro grego encarregado destes assuntos diz, com uma ironia triste, que às vezes lhe pedem refugiados que sejam brancos, de olhos azuis e universitários, não compreendo esse desabafo e não é seguramente o caso em Portugal", comentou.
Inquirido sobre se o motivo da reação grega teria sido o pedido da eurodeputada Ana Gomes para que as autoridades gregas tivessem especial atenção na resolução do problema desta comunidade, o MNE referiu que "várias personalidades e várias organizações - entre as quais a eurodeputada portuguesa Ana Gomes, que tem esse mérito - têm chamado a atenção para casos particularmente gritantes de pessoas que estão hoje em circunstâncias muito difíceis".
Por sua vez, Ana Gomes disse hoje à Lusa que a posição grega resulta de um pedido que ela própria e um colega austríaco fizeram para que as autoridades gregas resolvessem o problema desta comunidade, "particularmente vulnerabilizada por ter sido alvo de um autêntico genocídio".
"Estas pessoas têm sido vítimas de discriminação negativa na reinstalação noutros países europeus, quando deveriam ser alvo de discriminação positiva, devido à barbárie que sofreram", tinha já explicado a eurodeputada portuguesa à AP, ao regressar de uma visita a campos de refugiados na Grécia.
Durante séculos, os yazidis foram vítimas de purgas ordenadas pelos governantes, que consideravam os seus símbolos e práticas religiosos como sendo de adoração ao diabo -- uma explicação também utilizada pelos combatentes do EI para os atacar e eliminar.
A remota região iraquiana de Sijar, terra natal da minoria yazidi, é o local onde milhares de civis foram massacrados e de onde mais milhares fugiram em 2014. A ONU classificou os ataques como genocídio.
Os velhos preconceitos seguiram os yazidis até à Europa, onde eles se têm queixado de ataques de outros refugiados nos campos e são muitas vezes colocados em alojamentos à parte.
A Grécia diz que há mais de 60.000 refugiados e migrantes que chegaram ao seu território com esperança de ir para outros países da Europa e que estão encalhados" no país, depois de a União Europeia e os países balcânicos terem encerrado as suas fronteiras no ano passado.
Atenas debate-se com dificuldades para dar abrigo a todos durante o inverno e está a pressionar outros países da UE para honrarem os seus compromissos de reinstalação de migrantes.
Lusa