Opinião

Está a nascer uma grave crise financeira internacional

A ocorrência desta nova crise era mais que previsível, era uma questão de tempo. Só ninguém sabia onde nem exatamente quando começava. Mas só não viu a sua aproximação quem não quis ver. Nomeadamente os políticos e os reguladores financeiros portugueses.

José Gomes Ferreira

A pré-falência do Silicon Valley Bank não é o primeiro sinal de uma crise financeira iminente. Há poucos dias o fundo imobiliário americano BlackStone falhou o pagamento de um reembolso de obrigações no valor de cerca de 500 milhões de euros. Está agora a vender ativos de forma acelerada para evitar falhar outros pagamentos.

Já o Silicon Valley Bank está em regime especial de proteção de credores para que seja evitada a liquidação descontrolada dos seus ativos e a falência.

O paralelismo com o fatídico ano de 2007 não podia ser mais evidente. Naquele ano, em março, o banco Bear Stearns começou por dar sinais de fraquejar não conseguindo pagar as responsabilidades financeiras junto dos seus financiadores.

Poucos meses depois as duas grandes agências governamentais de crédito imobiliário a Freddie Mac e a Fannie Mae eram publicamente intervencionadas porque estavam em risco de não pagar aos bancos financiadores. Milhões de clientes de crédito hipotecário tinham deixado de pagar as suas prestações e as duas agências tal como o Banco Bear Stearns tiveram de ser postos em regime de proteção de credores.

Seguiu-se a falência do Lehman Brothers com as consequências que toda a gente conhece.

2007 e 2008 foram os anos do culminar de gigantescas emissões de dinheiro pelos bancos centrais europeu e americano para debelar os efeitos da crise das novas tecnologias que deflagrou nos mercados financeiros em 2001.

2023 é o ano de viragem de dez anos de emissão desenfreada de dinheiro pelos bancos centrais muito superior à primeira para conter e contrariar os efeitos da crise financeira e de 2007 e 2008 que, como sabemos, se tornou numa crise económica e depois numa crise bancária e numa grave crise de dívidas soberanas de estados mais frágeis e endividados, incluindo Portugal.

A solução para estas sucessivas crises sempre foi a emissão de mais dinheiro pelos bancos centrais para financiar Estados cada vez mais endividados. Reformas estruturais das economias ocidentais foram poucas ou nenhumas apesar de a Alemanha de Merkel ainda ter tentado obrigar a União a ir por essa via.

Mais de dez anos depois, os sinais de uma nova crise financeira internacional avolumam se. Mas, desta vez, os banqueiros centrais parecem ter-se lembrado dos princípios mais básicos da política monetária.

A uma crise de excesso de dinheiro no sistema financeiro que fatalmente gerou bolhas especulativas nas bolsas no imobiliário e até em infantilidade como Bitcoins e NFTs, teria de gerar inflação galopante - só se esqueceram desta teoria os políticos e banqueiros centrais demagogos - não se pode responder com uma nova emissão gigantesca de dinheiro pelos bancos centrais

Os presidentes da FED, do BoE (Bank of England), do BCE (Banco Central Europeu) e do Banco do Japão sabem perfeitamente que desta vez é diferente. Terão de atuar não através de um aquecimento global de concessão de crédito barato, mas através de um congelamento global da movimentação de ativos incluindo saldos de contas bancárias dos cidadãos para evitar bancarrotas sucessivas de bancos, fundos e outras instituições financeiras.

A legislação para implementar moratórias aos levantamentos bancários e resgate de ativos em massa já existe e foi aprovada discretamente pelo Conselho Europeu e pelo Parlamento Europeu por proposta do BCE.

Neste cenário de uma nova crise financeira que os banqueiros centrais e os governos do mundo ocidental não podem evitar - apenas tentar suavizar - o que deviam os governantes e os reguladores financeiros estar já a fazer?

Deviam estar já, este fim de semana, reunidos para estabelecer planos de contingência como decretar que os bancos comerciais não possam distribuir em dividendos os lucros de 2022. Esses lucros fabulosos conseguidos à conta de margens financeiras cada vez maiores entre crédito concedido com taxas mais elevadas e depósitos mal remunerados.

Mal faz Centeno em andar a criticar Lagarde pelo aumento das taxas de juro - decidido muito tarde, o que agravou as condições da crise - em vez de estar já a prevenir que os banqueiros voltem a bater à porta dos contribuintes.

Em breve infelizmente voltaremos ao mesmo fado. Falências de restaurantes de empresas de comércio de setores inteiros da economia e aumento do mal parado dos bancos.

De seguida serão os juros das dívidas soberanas a disparar, desta vez, dos grandes europeus como a Itália e a França, economias com pés de barro por falta de reformas de fundo durante muitas décadas.

Melhor faria António Costa em olhar para a saúde financeira do país em vez de andar a promover pacotes de ocupação de casas e liquidações de setores inteiros como o Alojamento Local.

O que aí vem não é bonito. E só não vê quem não quer ver.

Bastava ler o texto que publicámos em novembro de 2021: Para que ninguém diga que não foi avisado.

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