Mundo

Do sangue do filho à IA: os métodos radicais de Bryan Johnson, o homem que quer desafiar a morte

O diretor de investigação em envelhecimento no King's College, em Londres, diz que "números são bons para o marketing", mas pouco significativos. A equipa da Blueprint, startup fundada por Bryan Johnson discorda totalmente dessa perspetiva. O milionário está seguro de que segue no caminho da vida eterna: "Vemos a imortalidade de fato nascer, onde se pode treinar um modelo de IA para replicar um humano".

Reprodução Facebook

Marta Ferreira

Para muitos a vida eterna é apenas uma fantasia, um sonho impossível que jamais alguém alcançará, mas Bryan Johnson, um milionário que originou um documentário na Netflix, está determinado a consegui-lo (ou quase, mas já lá vamos). Viver para sempre: terá esta ideia fundamento científico ou será apenas uma utopia?

Bryan Johnson, atualmente com 48 anos, dedica mais de seis horas do seu dia para se certificar que consegue reverter o seu processo de envelhecimento. Como? Através de um método de autoanálise exaustivo - que regista religiosamente - que passa por medir diariamente a sua temperatura corporal ao acordar, uso de séruns para crescimento capilar, exercício físico durante uma hora (com treino de cárdio, força e equilíbrio), sauna de 20 minutos, terapia de luz vermelha e terapia de hipóxia (esta última é uma nova adição, que envolve respirar concentrações variáveis de oxigénio). E tudo isto antes sequer do pequeno-almoço.

E a rotina não se fica por aqui. Segue-se o consumo de uma mistura de nozes moídas, sementes e mirtilos, azeite extra virgem, extrato de sumo de romã, cacau, proteína de colagénio, proteína de ervilha e cânhamo, canela em pó, ómega 3, ómega 6, extrato de semente de uva e leite de noz de macadâmia, entre outros ingredientes. O objetivo é "seguir os dados e a ciência" e reverter o envelhecimento.

"Muitas pessoas ouvem isto e pensam: 'Isso é loucura'", disse à publicação NewScientist, especializada em temas relacionados com a ciência.

"Pensem nisto desta forma: eu sou um atleta profissional de rejuvenescimento. Sou como um atleta olímpico, mas para a longevidade", apontou.

A decisão de correr atrás de uma 'vida eterna' foi tomada após uma série de acontecimentos na sua vida pessoal, desde o fim do casamento à saída da igreja mórmon em que foi criado. Nessa altura decidiu vender a empresa que detinha e conseguiu arrecadar milhões de dólares que agora utiliza para financiar aquele que considera ser o seu propósito e objetivo de vida.

Foi neste âmbito que anunciou em 2021 o projeto Blueprint, integrado na startup com o mesmo nome, e transformou-se na cobaia do próprio projeto. Meta: reverter “ao máximo” a idade biológica.

Para alcançar este objetivo, reuniu uma equipa de investigadores com 30 especialistas em diversas áreas - onde nada é deixado ao acaso - e iniciou várias experiências em si mesmo, como, por exemplo, os ensaios com rapamicina.

A rapamicina é um medicamento originalmente formulado para atuar como um imunossupressor em pessoas que passaram por um transplante de órgãos e está a ser investigado pela equipa de Johnson por apresentar, alegadamente, possíveis efeitos antienvelhecimento.

Outra das experiências levadas a cabo pelo milionário foi injetar-se com sangue do próprio filho para retardar o envelhecimento. Seis meses depois, "sem benefícios detetados", parou com as transfusões e acabou com a experiência.

Todos estes dados são recolhidos pela equipa do milionário, mas a verdade é que não foram revistos por pares, o que torna esta evidência pouco fiável.

Terá mesmo fundamento científico?

Richard Siow lidera o departamento de investigação sobre envelhecimento no King's College, em Londres, e considera que os biomarcadores usados como evidência pelo projeto de longevidade são "bons para o marketing", mas pouco significativos.

Para o especialista em envelhecimento, indicadores de inflamação encontrados no sangue, capacidade pulmonar, níveis de lípidos, colesterol e epigenética são indicadores modificáveis, pelo que não são assim tão legítimos. Apesar de isto não significar que não seja possível atribuir "idades" a estes biomarcadores - por exemplo, Johnson alega que a sua capacidade cardiovascular é melhor do que 85% das pessoas -, a verdade é que esta atribuição não é rigorosa porque não existem dados populacionais que analisem os biomarcadores médios de pessoas em cada faixa etária.

Segundo Siow, as clínicas de longevidade que oferecem estes testes, baseiam-se em conjuntos de dados limitados.

"Os números são bons para o marketing, mas clinicamente pouco significativos", garante.

Por outro lado, a equipa do "homem que não quer morrer", como tem ficado conhecido, discorda: "Bryan Johnson conhece a idade biológica dos seus órgãos através de testes e monitorização científicos exaustivos, recorrendo a uma variedade de métodos, incluindo ressonâncias magnéticas, ecografias, análises ao sangue, rastreios genéticos (como relógios epigenéticos) e outros testes clínicos."

Esses dados não foram, contudo, revistos por outros especialistas.

Podemos aprender alguma coisa?

Apesar de não garantir que tenha vida eterna, há dicas valiosas que o milionário considera que podem ajudá-lo a viver melhor e, quem sabe, viver até aos 100 anos. Estas dicas são um conjunto de hábitos encadeados que podem resultar numa melhor qualidade de vida. Segundo Bryan, uma dica útil é reduzir a sua pressão arterial e fazer exercício físico antes de dormir. A explicação é simples: estes hábitos farão com que durma melhor, consequentemente estará mais disposto a exercitar-se no dia seguinte o que fará com que tenha mais apetite e possa, potencialmente, procurar ter uma alimentação saudável.

Para reduzir a pressão arterial, o milionário recomenda que não coma nada quatro horas antes de dormir e reserve uma hora para relaxar antes de ir dormir. Esse momento pode ser preenchido por leitura, caminhada ou meditação.

Deve ainda evitar ecrãs, algo que já foi inclusive alvo de estudo. Utilizar um ecrã durante uma hora na cama depois de se deitar aumenta o risco de insónia em 59%, reduzindo o tempo de sono em 24 minutos, segundo um estudo que envolveu um inquérito a 45.202 jovens adultos na Noruega e que foi publicado na revista científica Frontiers in Psychiatry.

Por fim, certamente já saberá que estimulantes como a cafeína perto da hora do sono não são seus amigos na hora de ir dormir. Estes aumentarão a sua frequência cardíaca e consequentemente dificultam-lhe o sono.

Viver para sempre? Há uma maneira

Johnson leva seus próprios conselhos ao extremo, mas sabe que não viverá para sempre - pelo menos fisicamente. Para o milionário a vida eterna vai além do físico e recorda como atualmente podemos treinar a Inteligência Artificial (IA) para criar uma versão alternativa de nós próprios.

Parte do seu esforço pela longevidade é transferir os seus pensamentos para um modelo de IA, garantindo que existirá de alguma forma por um período incalculável de tempo.

"É a primeira vez que vemos a imortalidade de fato nascer, onde se pode treinar um modelo de IA para replicar um humano... As mudanças que veremos com a IA serão tão drásticas e acontecerão muito mais rápido do que o prazo previsto de 40 a 50 anos que me resta", afirma Johnson.
Últimas