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O que se sabe sobre a controversa corrida espacial da Coreia do Norte?

Pyongyang anunciou que quer lançar um satélite até ao final do mês, desafiando os avisos de Seul e as resoluções da ONU que proíbem Pyongyang de utilizar tecnologias de mísseis balísticos. Porque os lançamentos de satélite da Coreia do Norte suscitam condenação?

Lançamento de míssil balístico intercontinental Hwasong-18 pela Coreia do Norte em abril de 223.
KCNA

Catarina Solano de Almeida

A Coreia do Norte notificou a guarda costeira japonesa esta segunda-feira 20 de novembro da sua intenção de lançar um satélite entre quarta-feira e 1 de dezembro, noticiou a agência japonesa Kyodo.

O anúncio gerou imediatas críticas do Japão e da Coreia do Sul, que dizem que tais lançamentos violam a proibição da ONU de Pyongyang desenvolver mísseis porque será uma nova tentativa de lançar um satélite militar espião como as que falharam em maio e agosto, segundo a Kyodo.

Esta será a terceira tentativa este ano: as duas anteriores, a 31 de maio – o primeiro lançamento desse tipo desde 2016 – e 24 de agosto, terminaram em fracassos violentos quando os novos foguetões Chollima-1 caíram no mar.

Satélites, mísseis e uma bandeira na Lua

Desde 1998, a Coreia do Norte lançou seis satélites, dois dos quais terão alcançado a órbita com sucesso, e o último lançamento foi em 2016. Observadores internacionais dizem que os satélites parecem estar sob controlo, mas não há certezas sobre se algum enviou alguma transmissão.

Em 2016, um alto funcionário da agência espacial da Coreia do Norte disse que estava a ser planeada a colocação em órbita de satélites mais avançados até 2020 e, eventualmente, "colocar a bandeira da (Coreia do Norte) na Lua".

Durante um congresso do partido em janeiro de 2021, o líder Kim Jong revelou uma lista de desejos que incluía o desenvolvimento de satélites de reconhecimento militar.

O Chollima-1 parece ser um projeto novo e provavelmente usa os motores de combustível líquido de bico duplo desenvolvidos para o ICBM Hwasong-15 de Pyongyang, segundo analistas citados pela Reuters.

A Coreia do Sul recuperou alguns dos destroços do Chollima-1 – incluindo, pela primeira vez, partes de um satélite – mas não divulgou resultados detalhados e afirmou que o satélite tinha pouco valor militar.

Em setembro deste ano, Kim Jong-un esteve na Rússia onde visitou o centro de lançamento espacial mais moderno. Na altura, o Presidente Vladimir Putin prometeu ajudar Pyongyang a construir satélites. As autoridades sul-coreanas afirmam que o próximo lançamento norte-coreano tem assistência técnica da Rússia mas não especificam o quê.

Quais são as resoluções da ONU?

Pyongyang está proibido de usar tecnologia de mísseis balísticos devido a uma série de resoluções do Conselho de Segurança da ONU, uma das quais exige especificamente que o país “não realize testes ou lançamentos nucleares usando tecnologia de mísseis balísticos”.

A Coreia do Norte viola regularmente estas medidas, que descreve como ataques à sua soberania e já testou vários mísseis balísticos intercontinentais (ICBM).

A tecnologia utilizada tanto para lançamentos de satélites como para ICBM é “essencialmente a mesma”, explica Choi Gi-il, professor de estudos militares na Universidade Sangji da Coreia do Sul à AFP.

Quais são as diferenças entre lançamento de ICBM e de satélites?

O envio de engenhos para o espaço e o lançamento de ICBM exigem engenharia específica para foguetões e de “conhecimento de ponta”, dizem os especialistas.

Os mísseis balísticos incluem sistemas de orientação internos que lhes permitem sair da atmosfera e depois reentrar para atingir alvos definidos na Terra.

Quando um satélite é lançado, o foguetão transporta-o para uma determinada órbita e depois separam-se, caindo no solo ou no mar numa chuva de destroços.

“No que diz respeito aos ICBM, o domínio das técnicas de reentrada atmosférica é essencial para garantir que uma ogiva não queime antes de atingir o seu alvo”, descreveu à AFP Han Kwon-hee, do Missile Strategy Forum (Fórum de Estratégia de Mísseis).

“Mas para foguetões que transportam satélites, esse tipo de tecnologia que permite a reentrada atmosférica não é necessária, pois o seu objetivo é lançar um satélite além da estratosfera".

A Coreia do Norte já lançou algum satélite militar?

A Coreia do Norte não tem satélites operacionais no espaço, dizem os especialistas.

Dos seis satélites que Pyongyang lançou desde 1998, três deles apresentaram mau funcionamento assim que foram enviados para o espaço, mas dois terão alcançado a órbita. No entanto, nenhum sinal foi detetado de forma independente, pelo que se suspeita de avaria.

O último lançamento de um satélite por Pyongyang remonta a 2016.

Já lançou algum míssil balístico?

Em 2017, a Coreia do Norte realizou um teste bem sucedido do seu primeiro míssil balístico.

“Os satélites lançados anteriormente pela Coreia do Norte foram, na verdade, testes de mísseis balísticos apresentados como lançamentos de satélites normais”, garantiu à AFP o desertor An Chan-il, diretor do Instituto Mundial de Estudos Norte-coreanos.


Desde então, Pyongyang já fez vários testes com mísseis balísticos.

Tecnologia com dupla utilização

Os Estados Unidos e os seus aliados classificam os testes de sistemas de satélite da Coreia do Norte como “violações claras das resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas”. A Coreia do Norte afirma que o seu programa espacial e as suas atividades de defesa são um direito soberano.

O lançamento dos satélites foi condenado pelos governos dos Estados Unidos e da Coreia do Sul como um teste disfarçado de tecnologia de mísseis capazes de atingir o território continental dos Estados Unidos.

Desde 2016, a Coreia do Norte desenvolveu e lançou três tipos de ICBM e agora parece empenhada em colocar satélites funcionais no espaço. Isso não só lhe proporcionaria melhores informações sobre os seus inimigos, mas também provaria que poderá acompanhar outras potências espaciais.

A Coreia do Norte poderia usar esses satélites para atingir de forma mais eficaz a Coreia do Sul e o Japão ou realizar avaliações de danos durante uma guerra, disse Ankit Panda, do Carnegie Endowment for International Peace, com sede nos EUA à Reuters.

Com Reuters e AFP

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