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Eduardo dos Santos, o engenheiro que se tornou no 2.º Presidente que esteve mais tempo no poder

Recorde a vida, a ascensão e queda de um dos políticos que esteve mais tempo no poder e num dos países mais ricos de África.

SIC Notícias

Foi o segundo chefe de Estado que esteve mais tempo no poder - quase 38 anos. Formado em engenharia petrolífera, José Eduardo dos Santos liderou os comandos de Angola entre 1979 e 2017. A poucos meses de completar 80 anos, e com a família a contas com a justiça, não resistiu a uma paragem cardiorrespiratória na sua residência em Barcelona.

Os pais, naturais de São Tomé, imigraram para Angola nos anos 40. A versão oficial dá conta que José Eduardo dos Santos nasceu em Luanda em agosto de 1942 mas, segundo várias fontes, nessa altura os pais ainda estariam em São Tomé.

Tinha apenas 16 anos quando aderiu ao Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). Licenciou-se em Engenharia Petrolífera na antiga União Soviética e, em 1979, foi eleito para o Comité Central do MPLA. Nesse mesmo ano assume a liderança do partido e do país devido à morte de Agostinho Neto, de quem era conselheiro.

"Perante todos os homens, mulheres e crianças do nosso povo e, em especial, os operários, os operários, os camponeses e os combatentes juro respeitar e fazer cumprir a lei constitucional, as leis que regem e regerão a vida nacional", prometeu quando assumiu o poder.

Então com 37 anos, José Eduardo dos Santos era um dos mais novos Presidentes no continente africano e estava à frente de um país em guerra com outro dos movimentos independentistas, a UNITA, de Jonas Savimbi, e com a África do Sul, a do regime de segregação racial ou Apartheid, na fronteira com a Namíbia.

Nunca foi nominalmente eleito para o cargo. Nas primeiras eleições presidenciais de 1992 ficou à frente na primeira volta mas a segunda volta que iria disputar com Jonas Savimbi nunca chegou a acontecer. Denunciando fraude eleitoral, a UNITA voltou a pegar nas armas e o frágil processo de paz ruiu.

A guerra só terminaria em 2002 com a morte de Jonas Savimbi. Eduardo dos Santos manteve-se em funções sem legitimidade institucional. Às eleições legislativas de 2008, ganhas pelo MPLA, deveriam ter-se seguido as Presidenciais, mas Eduardo dos Santos mudou a Constituição, definindo que o chefe de Estado deveria ser automaticamente o líder do partido mais votado.

Assim, em 2012, nas eleições legislativas amplamente contestadas pela oposição uma nova vitória do MPLA deu a Eduardo dos Santos um mandato presidencial de cinco anos. A sua liderança foi descrita como reservada, laboriosa e tenaz, concentrando em si e no seu círculo próximo um poder absoluto.

A revista Forbes acusou-o de conduzir o Governo como se fosse a sua empresa de investimentos privada. E à boleia do crescimento económico provocado pela subida do preço do petróleo, Angola transitou do marxismo para o capitalismo mais selvagem, com a família de Eduardo dos Santos e a elite que a rodeava a fazer fortuna.

Intolerante à contestação e às críticas, José Eduardo dos Santos reprimiu manifestações, controlou a comunicação social e silenciou os opositores. Quando abandonou o poder deixou 40% da população angolana na miséria, apesar de a sua fortuna estar avaliada em mais de 20 mil milhões de dólares.

O homem que a revista Forbes considerou o pior presidente africano, a seguir a Teodoro Obiang da Guiné-Equatorial, anunciou em 2017 que não seria candidato, afastou-se do poder e a situação da família dos Santos complicou-se, em particular para a filha Isabel.

Quando anunciou que abandonaria a política angolana, os nomes dos filhos e do vice-presidente, Manuel Vicente, chegaram a ser equacionados como possíveis sucessores na Presidência. Mas em fevereiro o MPLA acabaria por confirmar que o candidato às eleições presidenciais indiretas de 23 de agosto seria o ministro da Defesa e número "dois" do MPLA, João Lourenço.

A mudança para Barcelona

Um dos bairros de eleição de Barcelona tornou-se, em 2019, a casa de José Eduardo dos Santos que, desde Espanha, viu a Justiça angolana apertar o cerco à família, em particular aos filhos mais velhos, depois de ter deixado a Presidência.

No final do ano passado, o homem que dirigiu os destinos do país durante quase 38 anos ainda regressou a Luanda durante alguns meses, período em que chegou a encontrar-se com João Lourenço, que lhe sucedeu no Palácio da Cidade Alta e que se recandidata nas eleições já em agosto.

Visivelmente mais magro e debilitado, em março, José Eduardo dos Santos regressou a Barcelona e desde então sucederam-se os rumores sobre o agravamento do seu estado de saúde.

No mês de maio, em resposta a críticas de uma das filhas, os médicos espanhóis que o acompanham escreveram uma carta a defender a competência de João Afonso, o clínico angolano que trata o antigo chefe de Estado há 16 anos.

Mas a situação clínica agravou-se e, na última quinta-feira, dia 23 de junho, José Eduardo dos Santos foi internado de urgência. Desde então, os familiares de José Eduardo dos Santos têm sido presença diária no centro médico, que a revista norte-americana Newsweek colocou na lista das melhores clínicas do mundo.

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