Guerra Rússia-Ucrânia

Vladimir Putin: leal ao poder e à Mãe Rússia

O perfil do Presidente russo, principal rosto do conflito na Ucrânia.

Amante de desporto e orgulhoso das proezas físicas de que é capaz, Vladimir Putin, de 69 anos, não rejeita uma prova radical ou a interação com animais selvagens. Afinal, quem é o Presidente da Rússia?

Nasceu a 7 de outubro de 1952 em Leningrado, atualmente São Petersburgo. Vladimir Vladimirovich Putin é o mais novo de três filhos de Vladimir Spiridonovich Putin, membro da Marinha Soviética, e Maria Ivanovna Shelomova, trabalhadora operária.

Quando nasceu, já os dois irmãos, Albert e Viktor, tinham morrido – este último de difteria. O sofrimento marcou a vida da família de Putin. A avó materna foi morta por forças nazis em 1941, o pai foi gravemente ferido no ano seguinte e os tios desapareceram, também na II Guerra Mundial.

Artes marciais e licenciaturas

Aos 12 anos, praticava sambo – uma arte marcial de origem soviética – e judo. Já na escola secundária, decidiu aprender alemão e, em 1975, licenciou-se em Direito na Universidade de Leninegrado.

Durante o percurso académico, ingressou no Partido Comunista da União Soviética, onde ficaria até ao fim da estrutura – e ilegalização -, em 1991.

Por esta altura, o atual Presidente da Rússia era visto, pelos colegas, como um rapaz envergonhado, pouco ligado a festas e convívios.

KGB: o perfil de vilão de James Bond

Aos 23 anos, Vladimir Putin juntou-se aos serviços secretos soviéticos, o KGB. Recebeu treino em Okhta, Leninegrado. Posteriormente, trabalhou no setor de contrainteligência e, mais tarde, foi enviado para Moscovo, para receber treino adicional.

Esta formação prepará-lo-ia para, de 1985 a 1990, partir para um dos momentos mais incógnitos da sua vida, em que terá exercido as funções de tradutor, sob identidade falsa, em Dresden, na Alemanha Oriental.

Já depois do colapso do regime comunista no país, Vladimir demitiu-se dos serviços ativos do KGB, após suspeitas de falta de lealdade. Regressou à União Soviética, em 1990, para trabalhar na Universidade de Leningrado, enquanto completava o doutoramento.

Só em agosto de 1991 se demitiu do posto de tenente-coronel, terminando a ligação à organização, durante a tentativa de golpe de Estado na União Soviética contra o Presidente Mikhail Gorbachev.

Família e fortuna “escondidas”

Em julho de 1983, Putin casou-se com Lyudmila Shkrebneva. Viveram juntos na Alemanha Oriental de 1985 a 1990. O casal teve duas filhas: Mariya Putina, nascida em 1985, e Yekaterina Putina, em 1986, e já tem dois netos.

Uma investigação da independente “Proekt Media” refere a possibilidade de Putin ter outra filha, Elizateva, nascida em 2003, com a milionária russa Svetlana Krivonogikh.

Em 2008 começaram a circular informações de que a relação entre Vladimir e Lyudmila estava em crise e que estaria noivo da campeã olímpica, Alina Kabaeva. O anúncio do divórcio aconteceu em junho de 2013.

Sobre as finanças de Putin sempre existiram vários relatórios. Em 2007, os documentos registavam que tinha 130 mil euros no banco e era proprietário de um apartamento em São Petersburgo, e em 2012, na conta bancária teria cerca de 100 mil euros.

No entanto, em diversas fotografias o Presidente russo exibe uma coleção de relógios avaliada em mais de 600 mil euros.

Desta forma, vários jornalistas e opositores políticos acreditam que Vladimir tem uma fortuna secreta, tendo também em conta a sua participação em diversas empresas estatais.

Uma casa 39 vezes maior que o Mónaco?

Em agosto de 2012, vários opositores divulgaram uma lista de 20 palácios e mansões alegadamente pertencentes a Vladimir Putin.

Para muitos, o mais chocante investimento é o chamado “Palácio de Putin”, na vila de Praskoveevke, no Mar Negro. Em construção e avaliado em quase um milhar de milhão de euros, seria alegadamente construído num terreno público, possuindo três heliportos e uma estrada privada paga pelo Estado.

Alexei Navalny, um dos maiores opositores ao regime de Putin, diz que a propriedade é 39 vezes maior que o Estado do Mónaco e que foi financiada através de um esquema de corrupção.

Duas paixões assumidas

Se pouco se sabe sobre a vida íntima e familiar de Vladimir Putin, já o amor aos cães é público.

Konni, Buffy, Yume, Verni e Pasha são alguns dos amigos de quatro patas que o Presidente russo recebeu de vários líderes nacionais.

Putin teve um importante papel na aprovação de leis de proteção animal, nomeadamente na proibição de jardins zoológicos dentro de superfícies comerciais e no abate de animais de rua, e na exigência de cuidados adequados a animais de estimação.

O desporto é parte da vida de Vladimir desde bem cedo. Fã de hóquei no gelo e de “bandy”, assume-se como adepto do Zenit de São Petersburgo.

O despertar para a fé

Filho de uma devota cristã e de um pai ateu, é assumidamente ortodoxo russo. A mãe, perseguida pelo Governo por motivos religiosos, batizou o filho, ainda bebé, às escondidas.

No entanto, de acordo com o líder russo, o despertar para a fé deu-se apenas em 1993, depois da mulher sobreviver a um grave acidente de carro, e acabou fortalecido em 1996, depois de ver a casa onde vivia a incendiar-se.

A entrada na política

Em maio de 1990, trabalhou como assessor na Câmara Municipal de Leningrado. Depois da queda da União Soviética, um ano depois, terá passado por momentos difíceis. Há quem diga que chegou a tornar-se taxista, facto que nunca foi oficialmente confirmado.

Como chefe da Comissão para as Relações Internacionais de Leninegrado foi investigado pelos serviços jurídicos da cidade, por alegadamente ter permitido a exportação de metais a um valor abaixo do preço, em troca de ajuda alimentar do estrangeiro, que nunca teria chegado à Rússia.

Com várias recomendações para que fosse demitido, continuou na Comissão até 1996, ao mesmo tempo que, desde 1994, ocupava vários cargos políticos e governamentais, como o de primeiro vice-presidente do Governo de São Petersburgo.

Ainda em 1995, organizou a campanha eleitoral do partido do poder na Rússia, o “Nossa Casa”, sendo, até 1997, líder da distrital de São Petersburgo.

O candidato que apoiou nas eleições em São Petersburgo acabaria por perder, o que o levaria a demitir-se de todas as funções governativas e administrativas, indo viver para Moscovo.

Depois foi nomeado para vice-presidente do departamento responsável pela passagem dos antigos ativos da União Soviética e do Partido Comunista para a atual Federação Russa.

Em março de 1997, foi nomeado pelo Presidente Boris Yeltsin como vice-presidente do gabinete presidencial, cargo que manteve até 1998. Foi escolhido por Yeltsin para diretor do Serviço de Segurança Federal (FSB), a sucessora do KGB na Federação Russa.

A chegada ao Kremlin

Em agosto de 1999, pelas mãos do Presidente Yeltsin, é nomeado primeiro-ministro da Rússia – o quinto num ano e meio.

Pouco conhecido, e com uma equipa de ministros escolhida a dedo pelo Presidente, muitos o apontariam como “mais um” e poucos acreditavam que duraria mais que os antecessores.

Com o aproximar das eleições presidenciais, os adversários de Boris Yeltsin entram numa campanha para evitar que Vladimir alcançasse o poder.

No entanto, o ex-agente do KGB beneficiaria de um conjunto de acontecimentos, como os ataques a vários apartamentos na Rússia e a invasão da região autónoma russa do Daguestão por “mujahideens”, um conjunto de combatentes radicalistas islâmicos.

A forma como enfrentou a situação levá-lo-ia a ganhar pontos entre a população russa, ganhando popularidade e ultrapassando os rivais à corrida pelo Kremlin.

A 31 de dezembro de 1999, o país foi surpreendido pela saída de Yeltsin do cargo de Presidente e, de acordo com a Constituição, Vladimir assumiria o lugar.

O primeiro decreto presidencial que assinou garantiu que o ex-Presidente e a família não fossem julgados por corrupção.

Três meses depois da saída de Boris Yeltsin, as eleições presidenciais marcadas para junho de 2000 seriam antecipadas. No dia 26 de março, 53% dos eleitores escolheriam Putin como líder.

Digam “Привет” ao novo líder

Em 2000, a Rússia diz “Привет” – que, em russo, significa “olá” – ao novo líder. No primeiro mandato de Putin, o objetivo passaria por combater a pobreza no país, entrando em confronto com os oligarcas russos.

Na corrida presidencial de março de 2004, foi reeleito com 71% dos votos. No discurso de vitória, considera o colapso da União Soviética como “a maior catástrofe geopolítica do século XX”, levando a Rússia a cair numa espiral negativa a nível socioeconómico.

Desta forma, tornaria como prioridades o desenvolvimento de vários setores de interesse público, como a saúde, a educação, a habitação e a agricultura.

Surge por esta altura a suspeita de um perfil mais autoritário do Presidente russo.

Primeiro, a condenação do presidente da Yukos, uma empresa do setor petrolífero, Mikhail Khodorkovsky, por fraude fiscal, seria considerada, pela imprensa internacional, como uma forma de retaliação pelo facto de ter financiado opositores liberais e comunistas ao Kremlin.

Mais tarde, em 2006, a jornalista Anna Politkovskaya, que teria partilhado um escândalo de corrupção no exército russo, é assassinada a tiro no prédio onde vivia, precisamente no dia de aniversário de Vladimir Putin, com o mundo a acusar o Presidente de não garantir a segurança e a liberdade de expressão devidas à comunicação social.

Um ano depois, um movimento chamado “Marchas dos Dissidentes”, liderados pelo grupo da oposição “A Outra Rússia”, inicia uma onda de protestos em várias cidades do país, resultando numa atuação policial agressiva e na detenção de 150 pessoas.

No entanto, o povo parecia estar com o líder. Em setembro de 2007, Putin dissolve o Governo a pedido do primeiro-ministro, Mikhail Fradkov, para “dar carta branca ao Presidente” na preparação das eleições parlamentares.

Em dezembro, o partido de Putin, “Rússia Unida”, vence as eleições, com 64% dos votos.

Dar a volta à Constituição

Em 2008, estava impedido de se candidatar a um terceiro mandato, de acordo com a Constituição russa. No entanto, um dia depois de Dmitry Medvedev ser eleito Presidente, nomeia Putin para o cargo de primeiro-ministro.

Os objetivos passavam a ser dois: combater os efeitos da crise económica global de 2007 e estabilizar a demografia na Rússia, depois de vários anos com a população a diminuir.

Fim das férias presidenciais

No mês de setembro de 2011, Medvedev, num congresso do partido “Rússia Unida”, anuncia ao mundo que apoia Vladimir Putin para Presidente.

Novas eleições, nova vitória. Em março de 2012, 64% dos eleitores escolhem mais uma vez Putin para estar à frente do Kremlin. Opositores ao regime e observadores internacionais alegaram fraude eleitoral.

Uma onda de protestos anti-Putin forma-se em todo o país.

A 6 de maio, entre oito a 20 mil pessoas protestaram na capital contra o Presidente, resultando em 80 feridos e 570 detenções.

Por essa altura, o “Rússia Unida” implementa leis contra a comunidade LGBT+, proibindo a bandeira às cores e literatura com conteúdos homossexuais. A resposta do Presidente foi igualmente polémica.

“Trata-se de uma proibição de propaganda de pedofilia e homossexualidade”, acrescentou, referindo-se aos visitantes da comunidade LGBT+ que estivessem na Rússia durante os Jogos Olímpicos de Inverno de 2014.

Não diz “não” a uma boa polémica internacional

O legado do Presidente russo terá sempre o registo da invasão militar de 2014 à Península da Crimeia, em 2014.

Com o “Euromaidan”, protestos na Ucrânia a pedir uma maior integração europeia, o líder de Kiev, Viktor Ynukovych, sai do poder. Ao mesmo tempo, militares russos assumiram o controlo de vários locais estratégicos na Crimeia.

Daqui, resultaria um referendo em que a população da Crimeia aprovou a anexação da república e da cidade de Sevastopol ao território russo.

A comunidade internacional questionou a existência de uma possível nova abordagem internacional de Putin: o plano de recriação de uma nova União Soviética, ideia que se fortalece com o atual reconhecimento da independência das repúblicas de Donetsk e Lugansk, e o combate à “Ocidentalização” dos países da Europa de Leste.

Durante a permanência no poder, esteve ainda envolvido na intervenção militar russa na guerra civil da Síria.

Nas eleições presidenciais russas de 2018, nada de novo. Vladimir vence. Já em janeiro de 2020, Medvedev e o restante Governo demitem-se, com Vladimir Putin a sugerir uma revisão constitucional que permitia aumentar o poder.

Meio ano depois, uma ordem executiva assinada pelo Presidente viria a aprovar a candidatura de Vladimir a mais dois mandatos de seis anos. Desta forma, poderá estar no poder até 2036.

Este mandato ficará marcado pelo reconhecimento, por parte da Rússia de Vladimir Putin, e da Duma, das autoproclamadas independentes repúblicas de Donetsk e Lugansk na região do Donbass, num momento de grande tensão e insegurança vividos na Ucrânia e no leste da Europa.

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