Curiosidades da Ciência

Prémios Ig Nobel: "Primeiro fazem rir, depois fazem pensar”

Aranhas zombies, lamber pedras ou sanitas que analisam as fezes: a competição anual que premeia a criatividade na investigação.

Prémio Ig Nobel de Geologia e Química, Jan-Zalasiewicz
Reuters TV

Catarina Solano de Almeida

Antes da entrega anual dos verdadeiros Prémios Nobel, são recompensadas com outro galardão as investigações mais insólitas e criativas, a maioria bem divertida. São os Ig Nobel, prémios que celebram a ciência mais excêntrica e as descobertas mais improváveis.

“Os Prémios Ig Nobel homenageiam conquistas que fazem as pessoas RIR e depois PENSAR. Os prémios têm como objetivo celebrar o ivulgar, homenagear a imaginação – e estimular o interesse das pessoas pela ciência, medicina e tecnologia”.

Lamber pedras quando se é geólogo, repetir uma palavra até perder o sentido, inventar sanitas para análise de fezes ou aranhas zombies: estes são alguns exemplos das “investigações” premiadas pelos anti-Nobel de 2023.

A cerimónia da 23ª edição dos Ig Nobel – uma brincadeira com a palavra “ignóbil” e o famoso Prémio Nobel - foi transmitida online a 14 de setembro. Verdadeiros vencedores do Prémio Nobel, alguns deles com chapéus extravagantes, anunciaram os vencedores de prémios no valor de dez mil milhões de mil milhões de dólares do Zimbabué. Ou seja, um valor próximo de zero dada a inflação astronómica deste país africano.

A revista científica de humor Anais da Investigação Improvável (Annals of Improbable Research) apresenta os dez vencedores:

Lambedores de pedras

O prémio de Química e Geologia foi para Jan Zalasiewicz, geólogo da Universidade de Leicester (Reino Unido).

“Por explicar porque é que muitos cientistas gostam de lamber pedras”.

O laureado explicou que escreveu o seu estudo intitulado “Comer Fósseis” depois de perceber que “os geólogos do século XVIII usavam o sabor das pedras para melhor as identificar”.

Repetir palavras indefinidamente

Na Literatura, uma equipa internacional de França, Reino Unido, Finlândia e Malásia foi premiada “pelo estudo das sensações vividas por pessoas que repetem a mesma palavra muitas, muitas, muitas, muitas, muitas, muitas, muitas vezes”.

Ao concluir que esta repetição tornou singular algo familiar e que possibilitou atingir um estado de “jamais vu” (“nunca visto”), o contrário de “déjà vu”.

“The The The The Induction of Jamais Vu in the Laboratory: Word Alienation and Semantic Satiation" é da autoria de Chris Moulin, Nicole Bell, Merita Turunen, Arina Baharin e Akira O’Connor

Ressuscitar aranhas e transformá-las em robôs

Para o Prémio de Engenharia Mecânica, uma equipa dos EUA “ressuscitou” tarântulas mortas para utilizarem as suas pernas como pinças. Em vídeo, mostram aranhas mortas cujas pernas se abriram e agarraram um pequeno objeto.

O trabalho de “necrobótica” envolve o uso de partes de animais em robôs, explicaram os investigadores da Universidade Rice, em Houston (Estados Unidos).

“Necrobotics: Biotic Materials as Ready-to-Use Actuators" é da autoria de Te Faye Yap, Zhen Liu, Anoop Rajappan, Trevor Shimokusu e Daniel Preston.

Sanita para análise fecal

Seung-min Park, da Universidade de Stanford, foi distinguida com o Prémio de Saúde Pública pelas sanitas capazes de analisar rapidamente as fezes.

Denominada "sanita de Stanford”, é um dispositivo que usa uma variedade de tecnologias – incluindo uma tira reagente para exame de urina, um sistema de visão computacional para análise de defecação, um sensor de “impressão digital anal”, capaz de reconhecer a qual indivíduo pertence o orifício examinado, um pouco como o software de reconhecimento facial para smartphones, e um link de telecomunicações – para monitorizar e rapidamente analisar as substâncias que os humanos excretam.

“A Mountable Toilet System for Personalized Health Monitoring via the Analysis of Excreta" foi publicado na revista Nature.

Falar ao contrário

O Ig-Nobel da Comunicação foi para uma equipa que estudou pessoas que conseguem falar ao contrário rapidamente.

A economista Esther Duflo, vencedora do (verdadeiro) Nobel da Economia, sugeriu que os investigadores estudassem esta prática muito difundida em França.

O trabalho “Neurocognitive Signatures of Phonemic Sequencing in Expert Backward Speakers", de María José Torres-Prioris, Diana López-Barroso, Estela Càmara, Sol Fittipaldi, Lucas Sedeño, Agustín Ibáñez, Marcelo Berthier e Adolfo García, foi publicado na revista Nature.

Contar pelos do nariz de cadáveres

O Prémio da Medicina foi para uma equipa de investigadores que estudou o número de pelos nas narinas dos cadáveres. Os números variam de morto para morto, mas em média a narina esquerda contém 120fpelos, enquanto a narina direita tem 112.

“The Quantification and Measurement of Nasal Hairs in a Cadaveric Population" é da autoria de Christine Pham, Bobak Hedayati, Kiana Hashemi, Ella Csuka, Tiana Mamaghani, Margit Juhasz, Jamie Wikenheiser e Natasha Mesinkovska,

Um gosto elétrico

Os japoneses Hiromi Nakamura e Homei Miyashita destacaram-se na categoria Nutrição graças ao desenvolvimento de pauzinhos e palhinhas eletrificados que realçam o sabor de alimentos e bebidas.

“Ajuda a aumentar o sabor salgado dos alimentos”, disse Homei Miyashita na cerimónia de prémios.

Tédio que entedia

Os professores terão prestado especial atenção ao Prémio Educação atribuído a investigadores que estudam o efeito que podem ter nos seus alunos se dão a aula com ar de estarem aborrecidos.

“Descobrimos que, se os alunos pensam que os seus professores estão entediados a dar a aula, ficam ainda mais entediados”, explicou o laureado Christian Chan, num tom cansado.

“Whatever will bore, will bore: The mere anticipation of boredom exacerbates its occurrence in lectures” é da autoria de Katy Tam, Cyanea Poon, Victoria Hui, Wijnand van Tilburg, Christy Wong, Vivian Kwong, Gigi Yuen e Christian Chan.

Pescoço torcido

Quantas pessoas que passam na rua olharão para cima se virem outras pessoas a esticar o pescoço para olhar para o céu?

Este é o tema de estudo de investigadores norte-americanos que venceram o Ig Nobel de Psicologia. Conclusão: quanto mais gente olhar para cima, mais os outros irão imitá-los.

“Note on the Drawing Power of Crowds of Different Size" é um estudo de Stanley Milgram, Leonard Bickman e Lawrence Berkowitz, publicado no Journal of Personality and Social Psychology.

Sexo, anchovas e mar

O Ig Nobel de Física premiou trabalhos que procuram medir se “a mistura das águas oceânicas é afetada pela atividade sexual das anchovas”.

“Acho que há um consenso de que isso não tem importância nenhuma”, lamentou Bieito Fernandez Castro, ao receber o prémio.

“Intense Upper Ocean Mixing Due to Large Aggregations of Spawning Fish”, de Bieito Fernández Castro, Marian Peña, Enrique Nogueira, Miguel Gilcoto, Esperanza Broullón, Antonio Comesaña, Damien Bouffard, Alberto C. Naveira Garabato e Beatriz Mouriño-Carballido, foi publicado na Nature Geoscience.

Curiosidades curiosas sobre os Ig Nobel

Só há um cientista que venceu tanto o Prémio Nobel como o seu “antónimo”.

O laureado com o Nobel da Física em 2010 Andre Geim tinha recebido anos antes o Ig Nobel por fazer um sapo flutuar.

  • Qual é o objetivo do prémio? “Ajudar as pessoas a descobrir coisas que são surpreendentes - tão surpreendentes que fazem rir e depois pensar”.

  • Há quanto tempo são atribuídos? Todos os anos, desde 1991, são entregues 10 galardões nas seguintes categorias: Literatura, Engenharia Mecânica, Saúde Pública, Comunicação, Medicina, Nutrição, Educação e Física.

Os verdadeiros Prémios Nobel serão entregues entre 2 e 9 de outubro.

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