As previsões apontavam um milhão de isolados no dia 30 de janeiro, mas a barreira foi superada já esta segunda-feira.
Com mais 19.839 casos ativos, o número total de infetados ficou em 509.628, que a somar aos 501.119 contactos em vigilância, resultam em 1.010.747 de isolados.
“É um bocadinho surpreendente para quem fez as contas no final de 2021, mas as dinâmicas são mesmo assim”, diz Henrique Oliveira.
O matemático do Instituto Superior Técnico aponta dois motivos para a antecipação do recorde, além do maior contágio da variante Ómicron: o aliviar das regras de isolamento nas escolas e a campanha eleitoral que tem sido feita.
Depois de detetado um caso, as turmas já não são colocadas em isolamento. “Isso faz com que haja um aumento muito elevado de casos, porque os contactos que produziram contágio continuam a subsistir nas turmas [por não terem sido isolados]”.
“Tomou-se uma medida, no meu entender precipitada, antes de perceber os reais impactos dela e sem vacinar as crianças, quando a taxa era de 30% só com uma dose, que com a Ómicron é praticamente insignificante”, lembra Henrique Oliveira.
“Isso provocou uma aceleração muito grande do número de casos entre os 0 e os 9 anos e isso é muito evidente”, conclui. Mas o que também é evidente para o especialista é o efeito da campanha eleitoral.
“Produziu um aumento muito grande de contágios inesperado, fora dos modelos. O que tínhamos colocado nesse sentido era uma campanha semelhante à presidencial do ano passado, que foi muito moderada e havia maior perceção de risco por causa da quantidade de vítimas mortais”.
Mas os partidos deram a volta às contas dos especialistas: “Com o entusiasmo, com a proximidade das sondagens, realizam ações de campanha em todo o lado, com candidatos locais em cada círculo, além das arruadas e da campanha dos líderes partidários que é o que vemos na televisão”.
A conclusão é o contra-senso de ter uma campanha a fazer aumentar a abstenção: “Vamos ter mais isolados no dia das eleições e a abstenção a aumentar graças a isso”.
“Isto é matemática, não é política”
Para votar no domingo estão todos autorizados a votar. A recomendação é que os isolados por infeção e por contactos de risco votem entre as 18h00 e as 19h00, mas não é uma imposição.
“Muitos vão votar, mas muitos vão-se retrair”, adianta Henrique Oliveira, do Instituto Superior Técnico. “Não sabemos qual vai ser o comportamento das pessoas em isolamento, se vão ou não, se vão de manhã ou se só vão naquela hora, e quando a modelação envolve comportamento humano é muito difícil de prever”.
O que parece certo é a subida na abstenção. Nessa altura, entre 1 milhão e 50 mil pessoas e 1 milhão e 100 mil pessoas deverão estar isoladas, sabendo que os jovens até aos 18 anos não votam (e representam agora uma larga faixa dos isolamentos por causa dos contactos e contágios nas escolas) e que já há habitualmente uma percentagem elevada na abstenção.
Sobra assim uma margem entre os 18 e os 80 anos que votariam numa percentagem de 48% a mais de 50%, cuja decisão de ir ou não votar será moldada por dois fatores, segundo o matemático.
“Há pessoas de maior idade ou mesmo sem ser de maior idade que não vão votar por medo – não deve ser muito elevado, mas vai acontecer -, e outro é o próprio facto de as pessoas que estão isoladas, doentes ou positivas não quererem sair de casa, ou não conseguirem, impossibilitadas pelos sintomas”, conclui.
Sobre o impacto da suspensão do isolamento para votar, Henrique Oliveira diz que há previsão de “algumas infeções devido ao ato eleitoral”, mas não põe as mãos no fogo: “Não temos uma bola de cristal”.
Pico previsto para a semana de 6 de fevereiro
A verdade é que o pico está ainda a 15 dias de ser atingido. Na segunda-feira da semana passada houve menos 10 mil casos do que os 32.758 registados neste dia 24. O risco de transmissibilidade tem vindo a aumentar, mas prevê-se uma queda ainda em fevereiro.
“A redução dos números vai dar-se por saturação. Como diz o diretor da OMS para a Europa, toda a população vai ter contacto com o vírus, o ritmo a que acontece é que pode ser mais moderado que não está a acontecer neste momento em Portugal”, diz Henrique Oliveira, que arrisca: “A pandemia, na vertente dos contágios atuais pela variante Ómicron vai desaparecer em Portugal e regressará no outono, como uma doença residente”.
O especialista deixa no entanto o aviso que uma doença residente (“aquilo a que se chama endemia, de forma errada”, acrescenta) não é necessariamente menos severa. “O tifo ou a varíola eram doenças residentes e provocaram milhões de mortes. A endemia não é uma vitória sobre a doença, a vitória é a erradicação”, conlcui.