O Presidente iraniano, Ebrahim Raïssi, defendeu esta segunda-feira que "a derrota" dos Estados Unidos no Afeganistão, onde os talibãs retomaram o poder, deve transformar-se numa "oportunidade de paz" no país vizinho da República Islâmica do Irão.
"A derrota militar e a partida dos Estados Unidos do Afeganistão deve transformar-se em oportunidade para estabelecer a segurança e uma paz duradoura nesse país", declarou Raïssi, afirmando que Teerão "deseja relações de boa vizinhança com o Afeganistão", segundo um comunicado oficial.
O chefe de Estado iraniano, que assumiu o cargo no início de agosto, emitiu estas declarações durante um encontro com o ministro dos Negócios Estrangeiros cessante, Mohammad Javad Zarif, de acordo com o texto divulgado na página de Internet da Presidência.
"A República Islâmica do Irão crê que a autoridade resultante da vontade do povo oprimido do Afeganistão é a fonte da segurança e da estabilidade", acrescentou Raïssi, ainda segundo o comunicado, que não menciona explicitamente os talibãs.
Assim, o Presidente iraniano instou todos os grupos afegãos a alcançarem "um acordo nacional".
"O Irão fará esforços a favor da estabilidade, que é hoje a prioridade do Afeganistão e, como país vizinho e irmão, insta todos os grupos a alcançarem um acordo nacional", disse na reunião com Zarif.
Sublinhou ainda que o Irão "está a acompanhar de perto a evolução dos acontecimentos no Afeganistão".
Na mesma linha, Zarif afirmou que "a violência e a guerra, tal como a ocupação, nunca resolvem os problemas" e deu as boas-vindas à formação do Conselho de Coordenação para a transição do poder para as mãos dos talibãs.
Esse conselho é integrado pelo ex-Presidente afegão Hamid Karzai; o presidente do Conselho Superior para a Reconciliação, Abdulah Abdullah; e o ex-senhor da guerra Gulbuddin Hekmatyar.
"Esperamos que possa conduzir ao diálogo e a uma transição pacífica no Afeganistão. O Irão está pronto para continuar os seus esforços de pacificação", declarou Zarif no domingo, na rede social Twitter, referindo-se à mediação que no passado Teerão realizou entre as partes em conflito afegãs.
O ministro dos Negócios Estrangeiros iraniano reuniu-se também esta segunda-feira em Teerão com o representante especial chinês para o Afeganistão, Yue Xiaoyong, para avaliar os últimos acontecimentos no país vizinho.
A porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinesa, Hua Chunying, afirmou que Pequim espera "responsabilidade" da parte dos talibãs e que estes ponham em marcha "um plano de trabalho inclusivo com todas as partes", para "obter uma transição pacífica" no Afeganistão.
Ao contrário de outros países, a China não encerrou a sua embaixada em Cabul, tal como não o fez o Irão, que tem cinco delegações diplomáticas no Afeganistão.
As autoridades iranianas efetuaram, contudo, algumas mudanças, como a transferência para Cabul do pessoal dos consulados de Mazar-i-Sharif, Herat e Kandahar, e a redução do número de diplomatas.
Como país vizinho, o Irão também se prepara para a eventual chegada de refugiados e, segundo o Ministério do Interior, está a pôr em prática um plano para dar alojamento de emergência e provisório aos afegãos nas províncias fronteiriças de Khorasan Razavi, Khorasan Sul e Sistão e Baluchistão
A chegada dos talibãs a Cabul no domingo precipitou a saída do país do Presidente afegão, Ashraf Ghani, após terem tomado o controlo de 28 das 34 capitais provinciais em dez dias, e sem grande resistência das forças de segurança governamentais, no âmbito de uma grande ofensiva iniciada em maio -- altura em que começou a retirada das tropas norte-americanas e da NATO do país, que deverá ficar concluída no final deste mês.
Um porta-voz do movimento islâmico radical, que governou no Afeganistão entre 1996 e 2001, disse no domingo à televisão pública britânica BBC que os talibãs pretendem assumir o poder no Afeganistão "nos próximos dias", através de uma "transição pacífica", 20 anos após terem sido derrubados por uma coligação liderada pelos Estados Unidos, pela sua recusa em entregar o líder da Al-Qaida, Usama bin Laden, após os atentados de 11 de setembro de 2001.
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