Desporto

O André Ventura que há em Bruno Lage

Opinião de João Rosado. O treinador do Benfica mantém o registo que marcou os festejos do título de há seis anos

TIAGO PETINGA

João Rosado

Um mês depois da última grande sondagem aos associados do Benfica antes das eleições marcadas para 25 de outubro, o Bayer Leverkusen apresenta-se na Luz para a quarta jornada da fase regular da Liga dos Campeões.

Sob a direção técnica de Kasper Hjulmand, o homem que foi escolhido para suceder a Erik Ten Hag mal começou a Bundesliga (não confundir com o compatriota que joga do outro lado da Segunda Circular), a equipa dos farmacêuticos surge no calendário das águias na data certa e no sítio certo.

O confronto realizar-se-á depois de duas temíveis viagens dos encarnados a Inglaterra, onde reencontrarão o campeão mundial Chelsea e depois o endinheirado Newcastle, o tal emblema que esteve prestes a contratar Pavlidis como sucessor de Alexander Isak, adquirido pelo Liverpool por 144 milhões de euros.

MANUEL FERNANDO ARAUJO

Na teoria, quando Alex Grimaldo regressar a “casa”, o espanhol e restantes companheiros estarão a prestar um duplo favor, evitando a deslocação à Alemanha, verdadeiro território-pesadelo. Em desafios a contar para a prova milionária, os vice-campeões portugueses nunca venceram em solo germânico e num par de ocasiões saíram de lá mais triturados do que a carne picada que serve para fazer os hambúrgueres que tanto encheram o prato da atualidade nacional.

Martin Meissner

Noutro tempo, no tempo em que agitava a bandeira do Benfica nos debates televisivos, André Ventura, nem de propósito, seria o primeiro a perceber por que motivo Lage transforma o culto à cidadania num festival de equívocos, obviamente indigesto para a opinião pública.

Partindo do reconhecimento do próprio erro quando se escandalizou com a viagem autorizada de Marcelo a Berlim, Ventura ajudaria de certeza o treinador a encontrar a diferença entre uma comunicação virada para a sociedade e aquela que lhe cabe em exclusivo enquanto líder do balneário.

Da mesma forma que em 2019 não conseguiu fazer passar a mensagem nem o apelo para deixar o Marquês limpo depois da festa de comemoração do 37 (sem falar no conteúdo político que marcou a parte final do discurso proferido há seis anos), o substituto de Roger Schmidt continua hoje em dia amarrado a uma ingenuidade atroz.

No rescaldo do encontro com o Santa Clara, longuíssimos minutos depois do frustrante empate com os açorianos, conseguiu cair na mais gratuita e bizarra declaração sobre a… declaração de Otamendi. Uma vez que o capitão tinha assumido com espontaneidade o fatídico erro do minuto 92, o técnico estava proibido de recuperar a verdade de La Palisse que resiste à maior das erosões.

JOSE SENA GOULAO

Ao lembrar que a responsabilidade é sempre de quem escolhe e orienta os jogadores e que retirava a mínima dose de culpa ao defesa argentino, o que ficou é que por dentro fervilhava mesmo a intenção de entregar a cabeça do central, cuja desastrada intervenção no duelo com Vinícius Lopes dispensava quaisquer legendas ou perdões papais.

De tanto querer agradar e convencer toda a gente de que nunca vai deixar ninguém sozinho, Bruno Lage desgasta-se e perde-se num mar de contradições que lhe afoga a energia que devia canalizar só para a área profissional. Ainda ontem, na antevisão da partida desta noite com o Qarabag, sublinhou que não quer ser uma figura consensual, mas é exatamente isso que de forma constante tem perseguido desde que regressou ao Seixal.

Não se cansa de falar para os adeptos, não se cansa de lhes pedir apoio e não se cansa de lhes enaltecer o papel em algumas reconquistas. No plano eleitoral, não se cansa de avisar a oposição a Rui Costa de que se alguma vez fizer determinado tipo de comentários ao plantel, aí sim, vai interferir sem dó nem piedade, esquecido de que a multidão de candidatos à presidência tem tanto direito a pronunciar-se como… qualquer simpatizante.

E basta perder a última grande sondagem antes da ida às urnas, a realizar no Dragão por ocasião do FC Porto-Benfica de 5 de outubro, para o míster começar a fritar a suspeita de que alguém lhe pode dar um chega para lá antes sequer do Leverkusen se manifestar em Lisboa.

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