Com tudo o que diga respeito ao futebol de qualidade, bem jogado em campo e rodeado de gente séria e competente, cá fora. Gente capaz de transformar o jogo num espetáculo apelativo para o adepto, sedutor para o parceiro e valorizado no mundo.
Esse não me parece um objetivo desmedido ou inatingível. Pelo contrário. Há sinais positivos, fruto do empenho de excelentes profissionais (que os há) que me fazem acreditar que a indústria tem tudo para crescer e posicionar-se como uma das grandes referências internacionais do setor.
Mas este otimismo moderado não me tolda a lucidez nem me impede de ver o óbvio: há muitas ervas daninhas para arrancar enquanto se tenta fazer crescer o jardim.
E esse, convenhamos, é um trabalho chato e muito desgastante. Um trabalho que requer coragem e, acima de tudo, independência.
Reconheço que não será fácil, neste negócio, atingir esse patamar de firmeza e equidistância, até porque "poder e dinheiro" são mistura demoníaca, capaz de tentar o melhor dos samaritanos.
Mas há de chegar o dia em que os bons jardineiros apertam o certo aos fungos que afetam o seu trabalho, pulverizando-os de vez.
Trocando por miúdos: o futebol português precisa não só de excelentes executantes, árbitros e técnicos, como de dirigentes competentes e pessoas decentes à sua volta.
O futebol português precisa de ter uma arbitragem verdadeiramente independente, capaz de recrutar, formar e reter talento para o presente e futuro. Capaz de se mostrar mais, mostrando ao que vem.
O futebol português precisa de legislação forte que permita a existência de uma justiça desportiva célere. Uma que seja capaz de ser percecionada, cá fora, como modelar. Exemplar.
O futebol português precisa de mostrar mais e melhores mecanismos de transparência, em particular nas ações capazes de gerar dúvidas (ou receitas).
O futebol português não precisa de adeptos - sejam eles quem forem e de onde forem - que promovam medo, violência e racismo/xenofobia contra quem quer que seja.
O futebol português não precisa nem pode permitir comentários pré e pós-jogo que sejam inflamatórios ou instigadores de más condutas (ameaças, insultos, agressões, etc).
O futebol português não precisa de pessoas que não cumpram a sua função com a ética e seriedade a que estão moralmente obrigadas.
O futebol português precisa de mais tolerância, elevação e respeito. Precisa de educação e classe. De consciência, civismo e desportivismo. De empatia.
O futebol português precisa de dizer ao adepto comum que é barato e seguro ir ao futebol em família, sem receio de ser roubado ou agredido.
O futebol português precisa de se assegurar que todos aqueles que prosseguem agenda eticamente duvidosa ou que agem com base em expedientes menores, não podem fazer parte da indústria.
Vou repetir: é preciso coragem e independência, algo muito difícil de conseguir num universo dado a casamentos de conveniência.
É preciso repensar tudo isto, com boa-fé e sentido de dever. De que vale ter aspeto de mansão, se o interior parecer favela?