Ser ou Não Ser

“Não podemos culpar só os consumidores por comprar barato, cabe à indústria encontrar soluções sustentáveis. A roupa tem uma pegada enorme”

A indústria textil é considerada uma das mais poluentes, mas Luís Cristino, presidente da assembleia geral da Academia Têxtil garante que Portugal é pioneiro a nível europeu na sustentabilidade do setor e realça o projeto Be@t, que engloba 54 empresas, um projeto que trouxe um novo ritmo ao setor com um investimento de 138 milhões de euros na bioeconomia sustentável. Oiça a conversa com Luís Cristino no podcast Ser ou não Ser

Ser ou Não Ser

Longe vão os tempos em que herdar um casaco dos avós era motivo de orgulho, “peças únicas que depois de usadas ainda duravam mais 30 ou 40 anos”, lembra Luís Cristino. "Atualmente usa-se a roupa menos vezes, quer por questões de fast fashion, ou porque tem menor qualidade”, nota o presidente da assembleia geral da Academia Têxtil. Se antigamente as marcas faziam duas coleções por ano, agora fazem 50: “Será que o consumidor tem a noção de que, até chegar ao seu armário, uma peça de roupa dá a volta ao mundo duas ou três vezes?”, questiona o mesmo responsável, confessando estar atualmente na área da sustentabilidade para também se redimir dos seus próprios pecados ambientais. Afinal, foi empresário têxtil durante mais de 25 anos.

Em Portugal, diz Luís Cristino, as empresas já entenderam que têm de ser parte da solução e não do problema. O antigo empresário têxtil revela que atualmente já se tinge roupa com fermentação de bactérias e produzem-se corantes e fibra têxtil a partir de algas, sem o uso de produtos petroquímicos. “Não é ficção científica. A inovação e a tecnologia de ponta são as novas tendências do têxtil nacional”, afirma.

Luís Cristino lembra que, no passado, para um mau aluno o castigo era: “se não estudares vais trabalhar para uma fábrica!”. Por isto, fugia-se do trabalho do setor têxtil por ser visto como um emprego menor. No entanto, atualmente não há costureiras nem tintureiros, o que para Luís Cristino é preocupante. Afinal, a nível europeu, 30% a 35% da força deste tipo de trabalho está acima dos 50 anos, o que significa que se está a perder know how que nunca mais se recuperará caso os jovens não enveredem por este setor.

Na sua opinião a circularidade é o caminho para evitar o desperdício provocado pelo excesso de consumo. No entanto, alerta que “o maior aterro está nos nossos armários. Só usamos 30% da roupa que temos”. Por outro lado, a recolha seletiva de têxteis tem data marcada para dia 1 de janeiro de 2025, mas Portugal ainda não tem nenhuma entidade gestora nomeada nem um modelo definido.

“Não é fácil, porque é preciso criar um modelo logístico inverso”, diz Luís Cristino. A juntar a isto, devido ao Pacto Ecológico Europeu, “as marcas que disserem que as peças são ecológicas ou sustentáveis terão de o comprovar”, o que significa que as empresas têm mesmo de fazer a transição do seu modelo de negócio, até porque a introdução de um passaporte digital para produtos produzidos e vendidos na Europa virá nivelar o mercado e impor as novas regras do jogo.

Será desta que as etiquetas das peças de roupa terão impressas informações necessárias para esclarecer o consumidor do que está a comprar, como, por exemplo, a pegada carbónica, os componentes químicos, a quantidade de água utilizada, as origens da matéria-prima e qual a cadeia de valor. Pode ser que o Be@t introduza esta nova batida no setor, afinal, pretende criar novas fibras, circularidade, rastreio da cadeia de valor e prestar melhor informação ao consumidor.

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