Ser ou Não Ser

Maria José Roxo: “Devíamos consumir produtos portugueses, para melhorar a economia e evitar que determinadas culturas degradem os solos”

Seca no Algarve, incêndios, desertificação no Alentejo e solos regidos por decisões políticas sem real conhecimento do território são para Maria José Roxo alguns dos problemas que Portugal enfrenta. Ouça a conversa com a geógrafa e Professora Catedrática da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa no podcast Ser ou Não Ser

Ser ou Não Ser

“O sul do país será como o Norte de África. Vem aí o deserto!” Sempre que Maria José Roxo ouve estas afirmações alarmistas, fica apavorada. “As pessoas imaginam areia e dunas, mas essa não é a realidade”, apesar de confirmar que no baixo Alentejo a desertificação já ronda os 80% e na margem esquerda do rio Guadiana os valores já chegam aos 100%. Porém, ambos os cenários ainda são recuperáveis. “Os decisores deviam ir para o terreno para verem o impacto das decisões que tomam. Só desta forma se poderão tomar as medidas estruturais necessárias.” Defende ainda que Portugal precisa de uma zonagem agroecológica para se saber o que fazer em cada área do território.

Para Maria José Roxo, a ausência de uma estratégia para o território deve-se à “falta de vontade política” e a ciclos eleitorais a cada quatro anos, que muitas vezes não deixam pensar a longo prazo. “Não posso ter estratégias avulso. Agora são umas, depois são outras...” E dá o exemplo dos matos: “Estes não podem continuar a ser o bode expiatório dos incêndios. Têm de ser geridos porque são uma mais-valia. Sequestram carbono e têm valor económico, mas depois temos uma série de normativas do ponto de vista agrícola que os mandam cortar.”

E conta que viu cortar mato para faixas de gestão de combustível junto a uma barragem. “Só porque estava na lei tinha de se cortar? Aquilo fez uma coisa espantosa: quando chover vai arrastar para dentro da barragem uma quantidade enorme de sedimentos e de solo. De resto, nada mais fez!”

O tema da água ou da falta dela tem estado na ordem do dia devido à seca no Algarve. O Governo propôs reduções de 25% na agricultura, 15% no turismo e no consumo doméstico, optou por quotas de distribuição de água por município. Para Maria José Roxo, o problema é que Portugal nunca teve verdadeiramente uma estratégia de gestão dos recursos hídricos para o território onde fossem aplicadas medidas estruturais.

“É muito importante saber o que estamos a gastar e o que temos na realidade. Só com essa monitorização se poderá planear o futuro.” A professora universitária fala ainda no grande buraco negro dos recursos hídricos, dos recursos subterrâneos e da lei do Pro Solos (Prevenção da Contaminação e Remediação dos solos) que não sai da gaveta.

Termina com outro “slogan” que a tira do sério: “Vamos salvar o planeta!” Maria José Roxo, diz, convicta: “Não vamos salvar planeta nenhum. Este vai continuar aqui, lindíssimo e a equilibrar-se. Temos é de salvar a humanidade e isso pressupõe uma mudança de paradigma.”

Últimas