Depois de um investimento enorme na Fórmula 1, de um patrocínio milionário ao cricket, da aposta num circuito de golfe que quer fazer concorrência ao americano PGA, chegou a vez do futebol como arma diplomática da Arábia Saudita. Comprado o Newcastle, da Premier League, por 305 milhões de libras, chegou a vez de contratar Cristiano Ronaldo, no maior acordo de sempre do futebol.
Os contornos do contrato não são todos conhecidos, mas a Arábia Saudita não está apenas a comprar o jogador mundial mais popular no Médio Oriente e Ásia. Riade quer que Ronaldo seja uma peça fundamental na sua candidatura à organização do Mundial de 2030. Depois, e ainda na mesma década, a Arábia Saudita também quer organizar uns Jogos Olímpicos.
Parece uma ideia megalómana mas é apenas mais uma num país que vive do petróleo e que viu a sua riqueza aumentar significativamente no ano passado. A Arábia Saudita lidera a OPEP e consegue, quando combinada com a Rússia, – como aconteceu o ano passado – condicionar a produção e o preço de petróleo em todo o mundo.
Sabendo que a riqueza do petróleo pode estar em risco dentro de poucas décadas, o príncipe Mohamed bin Salman, o líder de facto do país, começou um ambicioso processo de diversificação, para que o país seja menos dependente do ouro negro. Em simultâneo, tentou atenuar algumas restrições religiosas e permitiu que as mulheres passassem a poder conduzir.
Mas estas aparentes mudanças – este ano, por exemplo, venderam-se pela primeira vez em Riade árvores de Natal – não disfarçam a brutalidade do regime. A Freedom House afirmou no relatório do ano passado que a Arábia Saudita estava “entre as piores das piores autocracias”. A ONU pediu em Novembro uma moratória nas execuções de condenados a morte, tantos eram os casos. Em março, terão sido executados 81 prisioneiros.
A arbitrariedade da justiça e a falta de transparência sauditas são imensas. Os casos que vão sendo divulgados no ocidente quase nunca são reconhecidos por Riade. Só no ano passado, houve pelo menos dois casos chocantes: uma mulher condenada a 45 anos por ter manifestado opiniões contrárias ao regime nas redes sociais; e uma estudante, que frequentava uma universidade inglesa, condenada a 34 anos por ter feito tweets de apoio a prisioneiros. Por vezes estes casos são amnistiados pelo poder político ao fim de alguns anos na cadeia. Mas a brutalidade da máquina judicial mantém-se intacta.
O país contratou uma das mais famosas (e caras) empresas de relações públicas americanas para gerir a imagem, que ficou devastada depois do assassinato do jornalista Jamal Khashoggi por agentes sauditas, em 2018, numa operação que o EUA garantem ter sido autorizada pelo príncipe todo poderoso de Riade. O seu poder mundial nos negócios tem crescido a olhos vistos. Além de ter a empresa a maior empresa do mundo - a Saudi Aramco utltrapasou a Apple em 2022 -, tem um fundo soberano que faz fortes investimentos em todo o mundo e um banco de investimentos que acabou por salvar o Crédit Suisse, com um investimento de 1,5 mil milhões de dólares.
Ronaldo e família aterram num país que quer chegar a 2030 com metade da sua eletricidade produzida por energia solar e eólica, receber um campeonato do Mundo de futebol e levantar da areia a futurista e megalómana cidade NEOM para fazer inveja ao Dubai, Abu Dhabi ou Qatar. O plano passa por conseguir ser o principal centro de negócios, transportes e turismo do Médio Oriente para se assumir como grande potência georgáfica. Dinheiro não falta. Mas falta quase tudo o resto.