Cerca de 274 milhões de pessoas em todo o mundo vão precisar de ajuda ou proteção humanitária no próximo ano, o maior número de sempre, estimou esta quinta-feira o Escritório das Nações Unidas para os Assuntos Humanitários (OCHA).
A ajuda humanitária a 183 milhões de pessoas mais necessitadas no mundo custará 41 mil milhões de dólares (36,2 mil milhões de euros), sublinha ainda o OCHA, num relatório e plano de ação divulgado esta quinta-feira a partir de Genebra.
"Em 2022, um total de 274 milhões de pessoas irão precisar de assistência humanitária e proteção - um aumento significativo em relação aos 235 milhões de há um ano, que já era o número mais alto em décadas", lê-se no documento.
Segundo os cálculos do OCHA, o equivalente a uma em cada 29 pessoas no mundo vão precisar de ajuda de emergência ou proteção humanitária no próximo ano, o que representa um aumento alarmante.
Em conferência de imprensa, o subsecretário-geral da Organização das Nações Unidas para os Assuntos Humanitários, Martin Griffiths, lamentou que os apelos humanitários raramente sejam financiados a 100%, pelo que 36,2 mil milhões de euros serão para dar resposta aos 183 milhões casos mais urgentes, em 63 países.
Os fundos serão dirigidos para assistência a 27 milhões de pessoas na República Democrática do Congo, 24,4 milhões de pessoas no Afeganistão, 25,9 milhões na Etiópia, 20,7 milhões no Iémen, 20,1 milhões na Síria e, entre outros grupos vulneráveis, a um milhão e meio de pessoas em Moçambique.
Este ano, o OCHA ajudou 107 milhões de pessoas, em projetos realizados com a ajuda de organizações não-governamentais, setor privado e governos.
Pandemia de covid-19, desastres climáticos e guerras
Segundo Martin Griffiths, o número de pessoas necessitadas está a aumentar devido à pandemia de covid-19, desastres climáticos e guerras, que causaram o aumento da violência de género, falta de alimentos e fome prolongada a 45 milhões de pessoas.
"A crise climática está a atingir primeiro e de forma mais grave as pessoas mais vulneráveis do mundo. Os conflitos prolongados continuam e a instabilidade agravou-se em várias partes do mundo, nomeadamente na Etiópia, Myanmar (antiga Birmânia) e Afeganistão. A pandemia não acabou e os países pobres estão privados de vacinas. O meu objetivo é que este apelo global possa contribuir de alguma forma para restaurar uma réstia de esperança em milhões de pessoas que dela necessitam desesperadamente", afirma o responsável para os Assuntos Humanitários da ONU, Martin Griffiths, sobre o relatório.
Sem uma resposta global à pandemia de covid-19, acrescentou o também Coordenador da Ajuda de Emergência da Organização das Nações Unidas, todos os efeitos secundários vão perdurar e agravar as necessidades em todo o mundo, criando uma situação de insustentabilidade.
"Temos de prever que o aumento contínuo dos últimos dois anos vai persistir, 274 milhões de pessoas em necessidade, nunca foram tantas. Não é sustentável", avisou.
43% da população de cinco países referenciados precisa de ajuda humanitária
Entre os vários países referenciados no GHO 2022, a ONU destaca os casos do Afeganistão, do Iémen, da Síria, de Myanmar ou do Haiti, onde "43% da população precisa de ajuda humanitária". Por exemplo, de acordo com o relatório, no Afeganistão, país sob controlo dos talibãs desde agosto passado, mais de 24 milhões de pessoas necessitam de ajuda, no que será uma "assistência para salvar vidas e para evitar a catástrofe".
"Isto representa um aumento dramático das necessidades", realça o relatório, precisando que este panorama está a ser impulsionado por uma combinação de fatores: "Conflitos, covid-19, tumultos políticos, choques económicos recorrentes e a pior seca dos últimos 27 anos".
Já no Iémen, "apesar dos esforços contínuos para mitigar o risco de fome", o documento avisa que "a insegurança alimentar continua a ser um desafio crucial", uma vez que é uma situação que afeta 16,2 milhões de pessoas no país. "Mesmo com os atuais níveis de assistência humanitária, 40% da população tem uma alimentação inadequada", refere o GHO 2022, destacando ainda um passo significativo: "No Iémen, os parceiros na área da saúde realizaram mais de 10 milhões de consultas médicas".
No caso de Myanmar, o relatório estima que 14,4 milhões de pessoas precisam de assistência humanitária, lembrando que o país do Sudeste Asiático enfrenta uma crise política, de direitos humanos e humanitária sem precedentes, "com necessidades que aumentaram dramaticamente desde a tomada do poder pelos militares e por uma grave terceira vaga da doença covid-19".
Mulheres são quem mais sofre na maioria das crises
O relatório GHO 2022 enumera ainda outros indicadores preocupantes do atual cenário da ajuda humanitária. "Mais de um por cento da população mundial está deslocada. A pobreza extrema está de novo a aumentar. Na maioria das crises, as mulheres e raparigas são as que mais sofrem, uma vez que as desigualdades de género e os riscos de proteção são agravados. A fome continua a ser uma perspetiva aterradora para 45 milhões de pessoas em 43 países", denuncia o documento, avançando que perante tal panorama, as organizações de ajuda humanitária intensificaram, em 2021, os esforços para tentar conter as piores consequências."
O responsável destacou que um aspeto importante no trabalho como Coordenador da Ajuda de Emergência é a "sinergia essencial que é necessária para parcerias, planeamento e implementação entre a comunidade humanitária e aqueles envolvidos na estabilização económica, desenvolvimento e redes de segurança social".
A ajuda humanitária é apenas "uma parte da solução" e faz a diferença em casos de vida ou morte, mas em todas as crises tem de haver solução política e investimentos na reconstrução, resiliência e desenvolvimento da sociedade, sublinhou ainda Martin Griffiths.
Na missiva, as organizações exortam os líderes a financiarem, em pleno, a resposta necessária para prevenir a fome a nível mundial e para enfrentar as principais ameaças que conduzem à insegurança alimentar: conflitos, crise climática, covid-19 e choques económicos.