João Cotrim de Figueiredo

João Cotrim de Figueiredo, o homem que era liberal e não sabia

Aos 15 anos, vendia cabides num negócio que nasceu pelas mãos do bisavô. Aos 60, ambiciona fazer crescer o número de deputados do Iniciativa Liberal no Parlamento – e também o país. O perfil daquele que poderá vir a ser o rosto de uma nova Direita. 

Nasceu em 61, é economista de profissão e liberal de coração, ainda que só mais recentemente o tenha descoberto. Ousado e com um sentido de humor apurado – pelo menos assim descrevem os amigos –, confessa que gostava de ser lembrado como um “gajo porreiro”.  

Este é apenas um pequeno resumo do homem que é presidente do Iniciativa Liberal (IL), João Cotrim de Figueiredo, mas para o conhecer mais a fundo é preciso regressar ao passado, ainda que este se prefira focar no presente e nas oportunidades que procura para as gerações futuras. 

Cabides, a herança do bisavô 

Nasceu a 24 de junho de 1961 e aos quatro anos de idade entrou para o Colégio Alemão, onde estudou até aos 18 anos. Pelo meio, e incutido pelos pais da ideia de que “o dinheiro não cai do céu”, assumiu vários empregos de verão.  

O que se destaca será, porventura, o primeiro de todos. Tinha 15 anos quando, em junho de 76, entrou no negócio de cabides do bisavô. Com o discurso na ponta da língua, adotou a missão de vender os cabides Manequim em lojas e armazéns. O sucesso bateu-lhe à porta e, numa das ocasiões, chegou a vender 300 contos em cabides. 

Viria a descobrir mais tarde que esse negócio estava praticamente acertado e ficou, por isso, furioso com o pai, contou numa entrevista à revista Sábado em 2019. Apesar da desfeita, nunca esqueceu a adrenalina da venda

“Fui bastante gozado, mas cresci muito naquele mês”, contou. 

Mais tarde, em 78, e já depois de ter saído do Colégio Alemão, João Cotrim de Figueiredo rumou a Londres para se formar em Economia no London School of Economics. Na capital britânica acumulou, ao mesmo tempo que estudava, vários pequenos trabalhos. 

O mundo dos negócios

No regresso a Lisboa, esperava-o o mundo dos negócios, onde se movimentou durante mais de 15 anos. Assumiu cargos de gestão em empresas como a Compal e a Nutricafés. Na banca foi CEO da Private Holdings (detentora do BPP) e passou até pela televisão, tendo sido diretor-geral da TVI entre 2010 e 2011. 

Foi Presidente do Turismo de Portugal, entre 2013 e 2016, e vice-presidente da European Travel Comission, órgão que reúne organismos de turismo de 33 países europeus que se querem promover fora do continente. 

Durante a sua passagem pelo Turismo de Portugal, Cotrim de Figueiredo esteve envolvido nas negociações que trouxeram a Web Summit para Lisboa, em 2015, classificando a tarefa como “difícil”, mas um “marco” para o país. 

A descoberta do liberalismo

O salto para a política aconteceu inesperadamente, em julho de 2019, quando anunciou a candidatura à Assembleia da República como cabeça de lista pelo Iniciativa Liberal. Como costuma dizer, “era liberal e não sabia”.  

Na publicação do Facebook de 14 de julho de 2019, em que formaliza a candidatura, revelou que este salto era uma surpresa até para o próprio, mas a inquietação que sentia impediam-no de “ficar sentado” enquanto via o país “socializar-se” cada vez mais

De olhos no futuro, assumia o objetivo de lutar por oportunidades iguais às que teve para as próximas gerações. 

“Quando assumi compromissos políticos, como candidato do Iniciativa Liberal, dei-me conta que tinha feito coisas muito interessantes na vida e que os meus filhos não iam ter as mesmas oportunidades que tive”, contou numa entrevista ao site Os 230. 

“Senti-me responsável pela minha geração não ter sido capaz de manter essa abertura de oportunidade. As pessoas que tinham algum poder, eu incluído, não fizemos o suficiente para manter essas oportunidades vivas e deixámos que o país se socializasse”, lamentou. 

Propôs-se, a partir de então, a cumprir com os ideais do liberalismo económico e social, lutando pela redução do peso do Estado e também dos impostos. Chegou ao “topo” em dezembro de 2019, quando iniciou mandato como presidente do IL. 

O homem para além do político 

Os amigos descrevem-no como um homem “culto e focado”, características que atribuem à educação alemã que recebeu durante toda a infância. Ainda que não o vejam como um homem consensual, admiram-lhe a ponderação de “medir bem os ambientes” e “nunca reagir a quente”, enaltece o advogado Vasco Vieira de Almeida. 

“A sua inteligência superior e capacidade de argumentação podem criar anticorpos, alguns podem ver nisso um exercício de afirmação da sua superioridade, mas do que ele gosta é do debate”, revelou o amigo, em 2019, em entrevista à revista Sábado. 

Os elogios somam-se. Na mesma entrevista, o antigo ministro da Economia, António Pires de Lima, amigo de Cotrim de Figueiredo desde os 20 anos, com quem chegou a passar férias, fala de uma “pessoa séria”, ousada, com um raciocínio “fora da caixa” e um humor que o acompanha

O liberal, que completa 61 anos de vida em 2022, tem quatro filhos, é benfiquista, adora andar de mota e diz ser apaixonado pelo Alentejo, local onde se sente em casa. Confessa-se fã de música e revela que o filme favorito é “A Vida de Brian”, dos Monty Python.  

E depois do dia 30? 

Em 2020, numa entrevista ao site Os 230, afirmou não ter ambições de fazer parte de um Governo e que a sua missão era abrir caminho para os que lhe sucedessem. Mais de um ano depois, e com as sondagens a apontarem para o crescimento do partido, Cotrim de Figueiredo já admite a possibilidade. 

Ainda que prefira “discutir políticas e não cargos” e não faça questão de ser o “n.º 2” de Rui Rio num Governo de Direita, não recusará caso seja chamado a assumir funções

“Não vamos discutir cargos. Sei que outros pedem ministérios e até dizem que ministérios são. Nós vamos discutir políticas e vamos pedir medidas, se a aritmética eleitoral a isso proporcionar”, afirmou, durante a campanha eleitoral para as legislativas. 

A frase que repete sem cansar 

Em 2019, numa entrevista à revista Sábado, João Cotrim de Figueiredo dizia, no âmbito das suas funções como presidente do Turismo de Portugal, que “aconteça o que acontecer, o importante é manter um plano para o turismo. Temos um rumo, e para chegar lá é preciso repetir a mensagem até à exaustão”. 

Três anos passados, a mensagem repetida à exaustão é outra, uma que espera que possa trazer um novo rumo ao país e que defende com unhas e dentes: “O liberalismo funciona e faz falta”.  

Falta saber se, no dia 30 de janeiro, o político que deseja ser relembrado como “um gajo porreiro”, vê a mensagem passar o teste nas urnas. 

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