As experiências adversas na infância não se limitam à infância
A investigação tem demonstrado que a exposição a vários tipos de experiências adversas acarreta uma maior variedade de problemas de saúde na idade adulta, uma vez que afetam negativamente o desenvolvimento cerebral, imunológico, endócrino e, inclusive, até a forma como o ADN é replicado.
Por exemplo, as pessoas com quatro ou mais experiências adversas na infância eram 12 vezes mais propensas a sofrer de alcoolismo, depressão, abuso de drogas ou a tentar o suicídio. As experiências adversas na infância aumentam três vezes mais o risco de morrer de doenças cardíacas e de cancro do pulmão; provocam uma redução de 20 anos na esperança média de vida.
Quanto mais experiências adversas um indivíduo vivenciou em criança, maior o impacto na saúde e no comportamento, sendo os danos causados de duas formas.
Primeiro, induzindo uma resposta crónica de stresse no cérebro e, portanto, no corpo, que diminui a imunidade à doença e potencia o desenvolvimento de uma variedade de doenças mentais e físicas, bem como a capacidade de recuperação.
Em segundo lugar, os efeitos combinados do stresse crónico e dos comportamentos de risco induzem uma série de estados de doença e problemas sociais. Em suma, a doença e o desajustamento aumentam, limitam o funcionamento e a qualidade de vida.
Stresse tóxico
Cada experiência adversa na infância representa um stresse significativo para a criança, que pode produzir tanto consequências biológicas, como também moldar escolhas comportamentais. Ou seja, estamos perante uma carga tóxica na mente e no corpo, que por si só é prejudicial e pode interferir com o desenvolvimento, a aprendizagem e a saúde, aumentando a probabilidade de se comer em excesso, fumar, abusar de drogas e uma série de outras formas de tentar evitar, reduzir ou lidar com o stresse.
Nas pessoas que passaram por experiências adversas na infância, em que o perigo estava em casa, o sistema de alerta encontra-se permanentemente ativado, deixando de ser funcional, saudável e passando a ser prejudicial para a saúde física e mental.
Tudo isto com a agravante de que as crianças são particularmente sensíveis a esta ativação constante, porque o corpo e o cérebro ainda se encontram em desenvolvimento.
Desvio e crime
A elevada exposição a experiências adversas na infância está relacionada com comportamentos de risco para a saúde, incluindo o consumo de drogas, alcoolismo, violência e crime, mesmo na vida adulta.
Por exemplo, uma análise dos relatórios de adultos do National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related Conditions, com a finalidade de prever a iniciação ao consumo de álcool, identifica que as experiências adversas na infância estavam associadas ao início do consumo de álcool antes dos 14 anos de idade.
Quanto à violência, uma amostra de adolescentes permitiu identificar que as experiências adversas na infância estavam associadas a um aumento do risco de violência interpessoal (por exemplo, delinquência, bullying, violência no namoro), bem como violência autodirigida (por exemplo, comportamentos auto-lesivos, ideação suicida e tentativas de suicídio). Inclusive, as experiências adversas na infância estão associadas a um aumento da probabilidade de reincidência e de ofensas ao longo da vida.
O surgimento precoce de problemas de comportamento está associado a comportamentos antissociais graves e persistentes na idade adulta, podendo evoluir para uma perturbação de personalidade antissocial. Sabe-se que as crianças cujos problemas de comportamento começam na infância têm três vezes mais probabilidade de desenvolver comportamentos antissociais.
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