Desporto

Digam aos treinadores que estão perto da perfeição para não estragarem tudo com o coração

Opinião de Duarte Gomes. Nas próximas semanas, tudo ficará decidido no futebol português: quem será o campeão, quem ficará em segundo lugar (com apuramento direto para a Liga dos Campeões), quem assegurará a manutenção e quem será despromovido. Também ficaremos a saber quem será o vencedor da edição desta época da Taça de Portugal.
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Duarte Gomes

Não é descabido assumir que a partir de 5 de junho a acalmia voltará, as emoções tenderão a desacelerar e o discurso baixará de tom. É assim ano após ano, com mais ou menos decibéis, em função do que esteja em jogo.

Mas até que lá cheguemos e até que tudo se defina, temo que a "latinidade" seja, mais uma vez, o álibi perfeito para justificar tudo o que é excesso e comportamento indevido.

Todos sabemos que o jogo é propício a emoções fortes e a momentos intempestivos, mas quem anda lá dentro sabe-o ainda mais, porque sente-os na pele. Vive-os todos os dias nos treinos, na preparação para a competição, nos noventa minutos de jogo e no rescaldo dos desempenhos.

Não é fácil, não é nada fácil. A pressão é altíssima, dura de suportar e nem sempre nos leva às melhores reações. É uma luta constante, essa a que a razão trava com o coração.

Mas depois... há o padrão.

Depois há as tais condutas reiteradas, constantes e sistemáticas. Depois há uma forma de estar que é tudo menos pontual, que é tudo menos ocasional. E essa não resulta de descontrolo passageiro ou de momento menos feliz, resulta quase sempre de uma incapacidade gritante em aceitar resultados, respeitar decisões e manter a elegância em contexto adverso.

É obviamente uma questão de elevação, contenção e educação e, como em tudo na vida, há quem tenha mais e quem tenha menos.

Quando um jogador, treinador ou árbitro tem maus comportamentos recorrentes, quando desrespeita tudo à sua volta, quando as coisas não correm de feição, quando ultrapassa a linha da razoabilidade vezes demais, está a dizer mais de si do que daquilo que contesta.

Está a mostrar ao mundo traço de personalidade difícil, que o futebol de alta competição tem que desincentivar, por alimentar perturbações sociais e passar o pior dos exemplos, sobretudo para os mais novos.

Quem atua a este nível, seja em que função for, sabe que está exposto aos olhos de milhões. Sabe que está ética e regulamentarmente obrigado a atuar com civismo, ganhe bem ou mal. Perca bem ou mal. Quem raramente o consegue fazer, tem que repensar seriamente duas coisas: a forma como se posiciona ou a carreira que escolheu.

Quanto à indústria, o pior que pode fazer é legitimar quem prova sistematicamente não ter equilíbrio emocional para desempenhar funções de topo. Repito: duas, três, meia dúzia de vezes... quem nunca? Mas uma carreira inteira a ter "momentos maus", parece um pouco demais.

Nunca é tarde para endireitar o caminho, para cair na real, amadurecer e perceber que o rumo tem que ser outro.

Nota: Este texto é particularmente dedicado aos treinadores que, cá dentro e lá fora, são capazes do melhor em termos desportivos e do pior, em termos comportamentais. Que alguém lhes diga que estão demasiado perto da perfeição, para estragar tudo com o coração.


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