A Cinemateca Portuguesa acaba de lançar um clássico do mudo, “Maria do Mar”, em DVD — a música foi composta por Bernardo Sassetti.
Mesmo não sendo especialistas das convulsões do mercado cinematográfico, todos os cinéfilos já perceberam que o DVD está a viver dias dramáticos. O poder comercial das plataformas de streaming foi esvaziando as suas potencialidades e o resultado está à vista: mesmo as lojas especializadas passaram a ter uma cada vez menor oferta de filmes em DVD.
Apesar disso (ou precisamente por causa disso), importa lembrar que a notícia da morte do DVD talvez seja algo exagerada… Em mercados de outra dimensão, obviamente gigantesca face ao espaço português (penso nos exemplos emblemáticos de França e EUA), o DVD, ainda que visando um nicho de consumo, tem desempenhado um papel importante no reencontro com muitas memórias de títulos mais ou menos “antigos” — sem esquecer que esse trabalho pedagógico é muitas vezes prolongado através do Blu-ray (formato de especial qualidade de imagem e som, infelizmente menosprezado no contexto português).
Daí que se justifique um destaque especial para as excepções que vão surgindo entre nós. A mais recente é a edição em DVD de “Maria do Mar” (1930), de Leitão de Barros, clássico incontornável do período final da produção muda.
Com chancela da Cinemateca Portuguesa — que fez o cuidadoso restauro do filme —, o DVD agora lançado apresenta como componente essencial a banda sonora composta por Bernardo Sassetti (1970-2012), a convite da Cinemateca, precisamente, na sequência do restauro iniciado em finais do século passado. A edição inclui uma curta-metragem de Leitão de Barros, “Nazaré, Praia de Pescadores” (1929), uma espécie de ensaio documental para o drama filmado no ano seguinte, e ainda um extra, organizado por Manuel Mozos, sobre o restauro e a gestação da música com depoimentos do maestro Vasco Pearce de Azevedo, do produtor José Pedro Gil e ainda de José Manuel Costa, director da Cinemateca.
Se é verdade que a nossa relação com o universo multifacetado do cinema depende sempre de uma sólida memória, em relação dialéctica com o presente, então esta edição constitui um belo exemplo de cinefilia. Sem esquecer que essa memória pode ser um factor decisivo na formação dos espectadores mais jovens.