Aos 25 anos, o artista que gosta de escavar muros e paredes a cinzel e berbequim, de modo a revelar a história por detrás dos estuques e deixar "cravados" nas fachadas os rostos de quem lá passou, deixa em São João da Madeira mais um mural em que subtraiu à parede o que não lhe interessa, em vez de acrescentar camadas às ruínas da antiga fábrica da Oliva.
A obra surgiu de um convite feito pela 'Oliva Creative Factory', um projeto que pretende afirmar-se como um centro de competência e excelência criativa em São João da Madeira e em que conhecimento, inovação, tecnologia e arte serão as áreas dominantes.
"Aqui, a ideia foi de alguma maneira tentar criar um paralelismo entre o marketing que existia à volta da Oliva a partir das fotografias de trabalhadores antigos da fábrica", disse em entrevista à agência Lusa.
"Quis cravá-los no muro que ainda existe, de modo a destacar uma série de pessoas que nunca foram valorizadas pelo marketing", disse.
Alexandre Farto começou a desenvolver este método de trabalho a partir dos murais e publicidade que se iam acumulando nas paredes de Lisboa a partir do 25 de abril de 1974.
"Quando era bastante novo, das primeiras memórias que tenho de muros, murais ou pinturas na rua, eram os murais da altura do 25 de Abril", disse à Lusa, acrescentando que a partir daí começou "a pensar sobre o que o muro significa na sua essência."
"Nessa altura havia um lado mais político dos murais", explicou, "mas depois, com a explosão da publicidade, começou a surgir uma série de 'posters'", que de alguma maneira tomaram conta do espaço público."
Vhils decidiu então "pensar nas camadas que vão-se acumulando como as histórias que estão por trás desse muro", até porque "o muro é algo que fica intemporal e que fica ao longo de todos os momentos que por ele passaram. Todos esses murais estavam presentes nos anos 1980 e 90 e foram, com o passar do tempo, desaparecendo."
Entretanto, surgiu uma outra camada que Alexandre Farto acabaria por revelar, o 'graffiti', que para o artista "também fez uso do espaço público" e levou-o a constatar que "este acumular de camadas e de mudança dos tempos fazia com que o muro parecesse era uma testemunha da velocidade com que as coisas estavam a mudar."
"O muro de alguma maneira estava a engordar à medida que estas mudanças aconteciam", observou.
Alexandre Farto, natural do Seixal, decidiu então que "em vez de pintar por cima dessas camadas todas que já lá estavam" preferia "pintá-las todas de branco, escavá-las por trás e fazer uma reflexão sobre o tempo em que vivemos".
"Tudo o que está para trás é tudo o que nos faz ser aquilo que somos, porque somos todos essas camadas, de alguma maneira", acrescentou.
Apesar do estilo que o tornou internacionalmente conhecido e o levou a "desfazer" murais um pouco por todo o mundo, Alexandre Farto admite criar uma nova linguagem para a sua arte, até porque continua a "explorar sempre, bastante, diferentes processos", pelo que deverá, em 2013, "começar a apresentar corpos de trabalho novo", num processo que "é uma constante evolução".
Lusa